Espanha: Direita franquista encarniçada contra medidas do governo do PSOE

Governo espanhol

Declaração da Redacção de Informação Operária, tribuna livre da luta de classes no Estado espanhol, publicada a 24 de Dezembro de 2018

Reivindicações operárias e direitos democráticos

Quase 4 milhões de trabalhadores vão ser imediatamente beneficiados pelos decretos aprovados pelo Conselho de Ministros, a 21 de Dezembro.

Os acordos aprovados incluem um aumento de 22,3% do salário mínimo, que afecta 1 milhão e trezentos mil trabalhadores (dos quais, 2/3 são mulheres), um aumento de 2,5% para os funcionários públicos de todas as administrações (que chega a 2,75%, em média, com os subsídios adicionais). A isto junta-se o anúncio do restabelecimento do IPC (Índice de Preços no Consumidor, ou seja, a inflação – NdT) para o cálculo da subida das pensões, a partir de 2019, que afecta 11 milhões de pensionistas.

A isto há que acrescentar ainda que, no dia 18, Pedro Sánchez tinha anunciado aos sindicatos uma resposta rápida sobre a anulação de alguns dos aspectos mais lesivos da reforma laboral de 2013.

Quase em seguida, a Associação patronal e as instituições que servem o capital financeiro – a começar pelo FMI e outras instituições internacionais, e acabando no Banco de Espanha – lançaram-se em catadupa a criticar duramente estas medidas, parciais, mas de pura justiça. Estas instituições são inimigas da democracia e querem despedaçar todas as aspirações e esperanças dos trabalhadores e dos povos.

Não há dúvidas de que Sánchez não concedeu todas as reivindicações pelas quais os trabalhadores se vêm mobilizando nos últimos anos, pois sofreram todas as consequências da crise, ao mesmo tempo que os grandes capitalistas e a Banca eram resgatados com milhões de Fundos públicos ou, inclusive, aumentavam os lucros. Mas, trata-se de um passo prático importante na boa direcção, correspondendo à vontade amplamente maioritária dos trabalhadores e dos povos. E também é evidente que – para os trabalhadores, os pensionistas, os jovens sem emprego e as mulheres que recebem baixos salários – essas medidas são um estímulo essencial para continuarem a luta pela plena satisfação de todas as suas reivindicações, pela anulação total das reformas laborais, pela defesa do actual sistema de pensões, pela recuperação dos serviços públicos e a restituição dos direitos dos seus trabalhadores e trabalhadoras.

A questão da Catalunha

O Governo não se limitou a tomar medidas de carácter social. A 20 de Dezembro, num encontro entre Pedro Sánchez e Quim Torra (actual Presidente da Generalidade da Catalunha, após Carles Puigdemont ter sido obrigado a exilar-se – NdT), ficou acordado um comunicado para “divulgar uma proposta dispondo de um amplo apoio do conjunto dos cidadãos catalães”.

Este compromisso é decisivo. Ele visa encontrar uma saída política que permita superar a situação criada pelos juízes, que prenderam os eleitos pelo povo catalão há um ano. Visa superar a situação em que foi realizado este Conselho de Ministros. De facto, procurar uma saída política democrática exige tomar em conta que 82% da população catalã reclama – e o resto dos povos de Espanha também, sob outras formas – exercer o direito de decidir sobre a maneira de organizar a convivência e as relações entre os povos. E esta exigência democrática do povo catalão é apoiada, cada vez mais, por amplos sectores de trabalhadores e de jovens em todos os povos do Estado espanhol, estando nos antípodas do que fizeram todos os governos até agora.

Não é por acaso que as mesmas forças que se opõem às medidas sociais elementares aprovadas pelo governo de Sánchez, gritam em coro – pela voz dos dirigentes do PP e de Ciudadanos – contra qualquer vislumbre de procura de uma saída política para a questão catalã, e caracterizam-na com grandes acusações de “traição” e de “humilhação”, ao mesmo tempo que reclamam a aplicação de um Artigo 155 muito mais duro que o de Rajoy, eliminando qualquer sombra de autonomia e espezinhando todos os direitos democráticos (1).

Basta ler o editorial do porta-voz da Casa Real, o ABC, do dia 22 de Janeiro, que – com o título “Sánchez humilha o Estado” – diz o siguinte: “Houve uma capitulação do Governo espanhol ao apoiar um comunicado infame que não faz qualquer alusão à Constituição ou à exigência de cumprir a lei”. Um comunicado que significa, segundo o ABC, “a desautorização do governo de Sánchez ao histórico discurso pronunciado pelo Rei há um ano” (refere-se ao discurso, de 3 de Outubro de 2017, em que o Borbón apelou o aparelho de Estado a cerrar fileiras contra os republicanos catalães, sem olhar a meios). A desfaçatez chega ao ponto de condenar a reabilitação de Lluís Companys (o último presidente do governo da Catalunha antes da vitória de Franco – NdT), feita pelo actual Governo (e que está ainda muito longe da anulação do processo e da condenação, como o exigem, para todas as condenações, as associações da Memória Histórica). Sobre isso, o ABC diz que “também é ofensiva para muitos millhões de espanhóis a reabilitação moral da figura de Lluis Companys”. Companys que foi entregue pela Gestapo à Polícia franquista, em 1940, torturado na Direcção Geral de Segurança em Madrid, julgado por um Tribunal militar extremamente reduzido e sem qualquer garantia jurídica, no Castelo de Montjuic, e a seguir fuzilado. A matriz franquista do ABC, do PP e de Ciudadanos não oferece dúvida.

Também é obrigatório tomar nota das declarações da Conselheira da Presidência e porta-voz do Governo catalão, que considera que as medidas do Conselho de Ministros não significam nada para o povo catalão. Elsa Artadi considera que o povo catalão é alheio ao salário mínimo, à retribuição dos funcionários públicos, à subida das pensões… Mas, de que povo fala ela? Elsa Artadi foi a autora do plano de cortes catalão, o mais brutal de todos os que foram aplicados no Estado espanhol. Contra esse plano levantaram-se os trabalhadores da Catalunha, inclusive os independentistas. O Governo catalão, de que Artadi é porta-voz, é o único no Estado espanhol que tem quatro anos de atraso no pagamento do prémio mensal relativo a horas extraordinárias roubadas quando fazia parte do Governo. As suas declarações não representam o povo catalão, elas têm a mesma linha de orientação que as de Ciudadanos e do PP: facilitar a rapina do capital financeiro.

Para os trabalhadores e os povos, libertar-se da herança franquista e dos demais agentes do capital financeiro é uma urgência vital para poderem ser alcançadas as soluções políticas, democráticas e sociais necessárias. Soluções que, em nossa opinião, só são possíveis rompendo com o Regime da Monarquia. É esta a limitação com que esbarram todas as medidas do governo de Sánchez.

Direitos sociais e direitos democráticos conquistam-se a par

De facto, é uma necessidade – como a água para quem tem sede – recuperar as conquistas sociais e acabar com todas as medidas antidemocráticas aprovadas pelo anterior governo de Rajoy.

O anúncio da data, finais de Janeiro, para o processo dos 9 republicanos catalães, sob a acusação de crimes inexistentes, tais como rebelião e sedição (instigar à revolta) – que mais de 400 juristas consideram inexistentes, num comunicado que tornaram público – é una cunha de grande calibre que os juízes franquistas querem cravar na fraternidade entre os povos, com o objectivo de facilitar assim os ataques aos direitos sociais exigidos pelo grande capital e as suas instituições.

É mais natural do que nunca estabelecer a relação entre direitos sociais e democráticos, afirmar – com base em factos – que só a acção conjunta dos trabalhadores e dos povos pode fazer frente às agressões em todos os terrenos, e que nenhuma via unilateral, à margem desses direitos, pode trazer uma solução.

Por isso, consideramos da máxima importância a realização de uma ampla campanha, em todo o país, pela anulação dos processos e a liberdade para os encarcerados, bem como o apoio ao Comício que, no próximo dia 26 de Janeiro, vai ter lugar em Madrid, com este objectivo, apoiado por 100 militantes operários, sindicalistas e democratas de todo o país, em conjunto com militantes de outros países.


(1) O Artigo 155 da Constituição do Estado espanhol permite ao Governo central assumir o controlo dos poderes autonómicos, a pretexto do desrespeito dessa Constituição franquista “remendada” em 1978.

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