
Incapaz de parar a expansão incontrolável da pandemia da COVID-19, os governos autónomos regionais e o Governo central puseram-se de acordo para declarar um novo “estado de alarme”, com novas restrições de mobilidade e cortes nos direitos e liberdades.
E nada menos que para seis meses. Uma imposição que muitos desconfiam que seja eficaz contra o vírus, na ausência de outras medidas, mas que aprofundará escusadamente a ruína económica, mergulhando ainda mais na miséria centenas de milhares de trabalhadores e de trabalhadoras que tenham esgotado o seu ERTE (1) ou que ficaram sem emprego.
NÃO ERA INEVITÁVEL E DEVERIA TER SIDO EVITADO FAZÊ-LO ASSIM
Apresentam-nos como inevitáveis os novos confinamentos. Pode ser que agora o sejam (se fossem acompanhados de outras medidas); mas eles poderiam ter sido evitados se – durante os 99 dias de confinamento e os primeiros meses da chamada “nova normalidade” – os governos tivessem tomado as medidas necessárias, tais como o reforço dos Cuidados Primários, contratar e formar rastreadores para identificar e isolar os contágios pelo vírus, reforçar os transportes públicos (para que a classe trabalhadora não tenha de ir trabalhar em transportes sobrelotados), adaptar os locais de trabalho (para que não se tornem em locais de contágio), contratar professores e construir ou adaptar salas de aula (para permitir centros de estudo presenciais e seguros), reforçar e adaptar os lares da 3ª idade, além de outras medidas que hoje em dia até uma criança pode reconhecer, mas que ainda não foram postas em prática.
Nada disso foi feito. E agora, mais uma vez os governos dizem que devem ser tomadas medidas de urgência, “inevitáveis”, sem serem acompanhadas por medidas sanitárias urgentes.
Há quinze dias, um Decreto-lei impôs medidas sanitárias de emergência, que permitem a aplicação da mobilidade forçada dos médicos e enfermeiros, dentro do hospital, ou dos Cuidados Primários para hospitais de campanha, bem como obrigar os médicos a trabalhar numa especialidade que não seja a sua ou contratar médicos sem especialidade para fazer as vezes de especialistas.
Madrid anuncia um novo hospital com 1.000 camas, cujos lugares de médicos e enfermeiros se pretende cobrir retirando pessoal de outros centros hospitalares, nos quais já são escassos.
Mas, apesar das instalações hospitalares se estarem a encher e as Unidades de Cuidados Intensivos voltarem a entrar no caminho do colapso, não é incluída nenhuma medida para assegurar que todos os recursos sanitários existentes se ponham ao serviço da comunidade, incorporando os recursos do privado na rede pública de Saúde.
Os contágios massivos regressam aos lares de idosos, cujas instalações não foram adaptados e continuem a ter os rácios de pessoal absolutamente insuficientes que tinham antes da pandemia. E eles continuam nas mãos do negócio privado, com uma presença crescente de multinacionais e Fundos-abutres. Tanto nos cuidados de saúde como nesses lares não há uma única medida que ponha em causa o sacrossanto negócio dos seus proprietários.
Todas as medidas adoptadas procuram preservar os interesses dos patrões e das multinacionais.
Restringem-se os contactos e limitam-se as presenças, salvo nas empresas e nos transportes públicos, onde a população trabalhadora continuará a ser enlatada.
DE NOVO, MEDIDAS RESTRITIVAS E REPRESSIVAS?
Incapazes de fazer parar o contágio aplicando medidas sanitárias, voltam de novo aos confinamentos forçados e às medidas repressivas.
Já no primeiro “estado de alarme” foram aplicadas mais de um milhão de multas utilizando a “Lei-Mordaça”, e desde então não têm parado de tentar criminalizar a juventude.
Agora, mais uma vez, serão polícias e guardas civis, quando não militares, a aplicá-las.
O que sabemos é que são impostas novas restrições ao direito de reunião, e que o decreto que declara o “estado de alarme” prevê a possibilidade de proibição de manifestações por “razões sanitárias”.
Não sabemos se desta vez haverá suficientes EPI (Equipamentos de Protecção Individual), respiradores e reagentes para testes PCR, mas sabemos certamente que a destruição da indústria tem continuado (Nissan, Alcoa, Alestis, Airbus, e um longo etc.), perante a passividade do governo de Sanchéz e dos governos autónomos regionais.
O Governo não tem uma política de defesa e promoção da indústria automóvel.
E também seria necessária uma poderosa indústria têxtil, farmacêutica e de manufactura para poder fazer face, com segurança, às necessidades.
MAIS DESCULPAS PARA ADIAR A RESPOSTA ÀS REIVINDICAÇÕES E NÃO CUMPRIR PROMESSAS?
A pandemia tornou-se na grande desculpa.
Ouvimos vários ministros dizer que “não é o momento” para revogar as contra-reformas laborais, porque “a situação económica não o permite”, ou a Lei-Mordaça porque “não é o momento oportuno” (enquanto o ministro Marlaska elogia, sempre que pode, a “utilidade” dessa Lei-Mordaça que o Governo de que faz parte se comprometeu revogar).
Também não é o momento – dizem – de recuperar os mais de 20 mil milhões de euros cortados na Saúde ou para inverter os cortes no Orçamento para os dependentes. Nem de recuperar os postos de trabalho perdidos nos serviços públicos.
Contrariamente, mantêm-se no projecto de Lei do Orçamento do Estado as taxas de reposição impostas pelo governo de Rajoy para limitar a admissão de funcionários públicos.
E estes deverão renunciar, mais uma vez, a recuperar o poder de compra perdido pelos cortes de Zapatero e de Rajoy.
E, tanto as medidas de “urgência” que limitam os direitos do pessoal da saúde, como as medidas que afectam os funcionários públicos, foram tomadas sem qualquer negociação com os sindicatos.
MAIS DO QUE NUNCA, É NECESSÁRIO A MOBILIZAÇÃO UNIDA
“É o que existe”, dizem-nos alguns. “É inevitável”, “Só a extrema-direita se opõe”, acrescentam outros. Inclusive há organizações a saudar a declaração de um novo “estado de alarme” sem criticar o seu conteúdo. Apesar disso, a resistência da população trabalhadora expressa-se nas mobilizações do pessoal da Saúde e nas da população em frente aos Centros de saúde.
A última: à notícia de construção de um novo hospital, responderam de imediato os trabalhadores da Saúde com uma recolha de assinaturas rejeitando a transferência e exigindo o preenchimento das vagas existentes, e ao que parece recolheram 2.000 assinaturas num dia.
Há também resistência nas mobilizações de professores, que pedem às organizações unidade para organizar a luta, e inclusivamente uma greve geral contra Ayuso (a Presidente da Câmara de Madrid), como fizeram os professores de Vicálvaro. E as incessantes mobilizações dos pensionistas. Há que acrescentar as mobilizações nos bairros operários de Madrid e em muitas outras cidades, em defesa dos serviços públicos e contra a repressão, e os justos protestos na Catalunha de pequenos comerciantes e dos serviços culturais. A classe trabalhadora não aceita a “unidade” que pretendem impor-lhe, e à qual se submetem alguns dirigentes.
E tem razão. Nem os trabalhadores nem as suas organizações podem aceitar mais sacrifícios em nome da suposta luta contra a pandemia, luta que se detém no limiar do respeito pela propriedade privada, pelos lucros das empresas e pelas instituições podres do Regime monárquico.
Há que dizer, alto e bom som, que aquilo de que precisamos é de medidas para salvar a Saúde e o Ensino públicos, os empregos na indústria, para salvaguardar as conquistas dos trabalhadores e as conquistas democráticas.
Nenhuma “união sagrada” em defesa dos interesses de capital! Nenhuma submissão às necessidades de um Governo que se submete ao capital financeiro e à Monarquia! Governe quem governar, as reivindicações e os direitos são para defender!
Debater como pôr em prática esta política deve ser uma das tarefas do Encontro que o Comité para a Aliança dos Trabalhadores e dos Povos (CATP) do dia 7 de Novembro.
29 de Outubro de 2020
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(1) Significa “Expediente de Regulação Temporária do Emprego” (equivalente ao “lay-off” simplificado de Portugal, que dá direito a um subsídio por paragem de actividade).
Esta Declaração é da responsabilidade do POSI (Partido Operário Socialista Internacionalista) é a Secção espanhola da 4ª Internacional.