Biden promete à humanidade o “apocalipse nuclear”

Durante o passado fim-de-semana, tiveram lugar explosões na ponte que liga o território da Crimeia ao território da Federação Russa, destruindo-a parcialmente. A Rússia acusa os Serviços secretos ucranianos. Alguns peritos militares ocidentais acreditam que foi necessária a ajuda dos serviços secretos de um grande país para realizar uma tal operação.

Em resposta, Putin anunciou uma retaliação, a partir de segunda-feira, numa reunião do seu Conselho de Segurança e, de imediato, mísseis atingiram – na manhã de 10 de Outubro – as cidades de Kiev, Zaporizhia, Lviv e outras localidades na Ucrânia. É a escalada na guerra!

Na quinta-feira, 6 de Outubro, iniciou-se em Praga a reunião do Conselho Político Europeu, com a participação de 44 países (os 27 membros da União Europeia e outros países não-membros). Este Conselho reafirmou o seu apoio a Zelensky e adoptou novas sanções contra a Rússia. Na Cimeira, Zelensky – ligado por videoconferência – apelou os países europeus a reforçarem ainda mais as sanções contra a Rússia e a deixarem de emitir vistos de entrada ao conjunto dos cidadãos russos. Numa palavra, ele está a imputar a todos os Russos, incluindo os que fogem da guerra, a responsabilidade pelo conflito armado e coloca-os nas mãos de Putin.

Esta Cimeira não fez mais do que implementar as exigências da Nato, ou seja, do imperialismo norte-americano. Biden, de facto, reafirmou que a guerra duraria muito tempo, até que a Rússia seja derrotada. E, numa escalada para a guerra, ele também fez pesar a ameaça de um “apocalipse nuclear”. Ao fazê-lo, Biden procura aterrorizar os povos do mundo para impor a sua lei.

É o imperialismo norte-americano que está ao leme e está a incentivar a guerra, sendo Zelensky apenas aquele que implementa esta política. Perante a agressão militar orquestrada por Putin, a intervenção dos EUA e da NATO não visa defender a soberania do povo ucraniano, a qual é apenas um pretexto para a defesa dos seus próprios interesses, contraditórios com os do povo ucraniano e do povo russo.

Laura Cooper, uma das responsáveis pela política do Pentágono, disse a 4 de Outubro que o Departamento de Defesa (dos EUA) tinha examinado as necessidades da Ucrânia em termos militares, concluindo que a combinação existente de lançadores Himar e de mísseis GMLRS era suficiente. “Nós acreditamos“, disse ela, “que eles podem atingir a grande maioria dos seus alvos, incluindo a Crimeia, e – para ser clara – a Crimeia é parte da Ucrânia.”

A questão é colocada, e a responsabilidade dos EUA e da NATO é claramente estabelecida, inclusive em relação aos ataques na Crimeia. Os EUA tomaram o controlo do Regime de Zelensky e do aparelho militar ucraniano com o objectivo de desmantelar a Rússia.

A nossa posição é clara: deve haver um cessar-fogo imediato para evitar uma catástrofe para toda a humanidade. Isto significa: o levantamento de sanções contra o povo russo, porque é ele que é capaz de derrotar Putin e o seu Regime.

É preciso parar os belicistas que estão a conduzir a humanidade para a catástrofe. É preciso parar as entregas de armas! Desmantelamento da NATO!

Rejeição da unidade nacional! Recusa de participar no pretenso combate entre “democratas” e “autocratas”, que nada mais é do que a aceitação das exigências do imperialismo. Recusa de aceitarem nome da entrada na economia de guerrao acompanhamento das medidas anti-operárias, a inflação, as reestruturações, etc.

Não marchamos atrás de Macron nem atrás de Biden. Pois, como disse Karl Liebknecht: “O inimigo está no nosso próprio país”.

Zelensky contra o Prémio Nobel da Paz e a favor de Meloni

Zelensky, o grande “democrata”, telefonou à chefe do partido de extrema-direita Irmãos de Itália, Giorgia Meloni, para a felicitar pela sua vitória nas eleições legislativas.

Um conselheiro do presidente Zelensky, pela sua parte, denunciou o Prémio Nobel da Paz atribuído este ano a duas ONG (o Russian Memorial e o Centro Ucraniano de Liberdades Civis), bem como ao bielorrusso Ales Bialiatski. Ele declarou: “O Comité Nobel tem um entendimento interessante de «paz» se representantes de dois países que agrediram um terceiro recebem, em conjunto, o Prémio Nobel”.

Assim, para este indivíduo, um adversário do Regime bielorrusso na prisão é “responsável” pela guerra, assim como o Russian Memorial, proibido pelo Regime de Putin e cujos militantes são perseguidos, seria também “responsável” pela guerra.

Isto está de acordo com a declaração de Zelensky ao dizer que todos os Russos deviam ser mortos e ao exigir que aqueles que desertam e fogem do país para evitar a mobilização de Putin fossem bloqueados nas fronteiras ucranianas. E isto acontece numa altura em que o recrutamento no Exército russo está a acelerar, sob o impacto de uma repressão de uma brutalidade sem precedentes.

Intelectuais ocidentais, pró-Zelensky, denunciam a saída da Rússia das centenas de milhares de homensque assumem todos os riscos ao recusar ir para a guerradizendo-lhes para ficarem na Rússia para combater Putin. É fácil de dizer, a partir do conforto do seu ecrã digital… O povo russo não quer a guerra e o ucraniano também não.

Perante Zelensky (representante dos oligarcas ucranianos e instrumento do imperialismo norte-americano) e perante Putin (chefe dos oligarcas russos), reafirmamosapesar da situação difícil actualque só a mobilização dos trabalhadores e dos povos pode impor a paz e o restabelecimento da fraternidade entre os povos.

Crónica da autoria de Lucien Gauthier, publicada no semanário francês “Informations Ouvrières” Informações operárias – nº 727, de 12 de Outubro de 2022, do Partido Operário Independente de França.

A face oculta de Zelensky (Presidente da Ucrânia)

Excertos de um artigo da autoria de Guy Mettan, deputado suíço e antigo editor-chefe do jornal La Tribune de Genève, publicado no site La Tribune diplomatique internationale (A Tribuna Diplomática Internacional), a 10 de Julho de 2022. (Os subtítulos são nossos)

Durante quatro meses, Zelensky – o Chefe de Estado ucraniano – tem aparecido nas primeiras páginas das revistas, abre os noticiários, inaugurou o Festival de Cinema de Cannes, discursa nos parlamentos, felicita e admoesta os seus colegas à cabeça de Estados dez vezes mais poderosos do que o dele (…).

Recordemos que Zelensky foi eleito com o score impressionante de 73,2% dos votos, com base na promessa de pôr fim à corrupção, para conduzir a Ucrânia na senda do progresso e da civilização, e acima de tudo para fazer as pazes com o Donbass de língua russa.

Assim que foi eleito, ele traiu todas as suas promessas, com um zelo tão inoportuno que o seu índice de popularidade caiu para 23% em Janeiro de 2022.

A partir de Maio de 2019, para satisfazer os seus patrocinadores oligarcas, o recém-eleito Presidente lançou um grande programa de privatização massiva de terras, incidindo sobre quarenta milhões de hectares de boas terras agrícolas, com o pretexto de que a moratória sobre a venda de terrenos teria custado ao PIB do país milhares de milhões de dólares.

No âmbito dos programas de “descomunização” e de “desrussificação”, Zelensky lançou uma vasta operação de privatização dos bens do Estado, de austeridade fiscal (orçamental), de desregulamentação das leis laborais e desmantelamento dos sindicatos, o que enfureceu a maioria dos Ucranianos que não tinham compreendido o que o seu candidato queria dizer com “progresso”, “ocidentalização” e “normalização” da economia ucraniana”. Num país que, em 2020, tinha um rendimento anual per capita de $3.726 (dólares, dos EUA) em comparação com os $10.126 do adversário russo, quando em 1991 o rendimento médio da Ucrânia era mais elevado do que o da Rússia, a comparação não é lisonjeira. E é compreensível que os Ucranianos não tenham aplaudido esta enésima reforma neoliberal.

Em termos de corrupção, o balanço não é melhor. Em 2015, o jornal Guardian estimou que a Ucrânia era o país mais corrupto da Europa. E, em 2021, a Transparência Internacional – uma ONG ocidental com Sede em Berlin, classificou a Ucrânia como 122º país mais corrupto do mundo, perto da odiada Rússia (136º). Não é brilhante para um país que passa por um modelo de virtudes contra os bárbaros russos. A corrupção está em todo o lado: nos ministérios, nas administrações, nas empresas públicas, no Parlamento, na Polícia e mesmo no Alto Tribunal de Justiça Anti-corrupção (de acordo com o jornal Kyiv Post). Não é raro ver juízes a conduzir um Porsche, observam os jornais.

FACTOS COMPROVADOS DE CORRUPÇÃO

O principal patrocinador financeiro de Zelensky – Ihor Kolomoïsky, residente em Genebra, onde tem um luxuoso escritório com vista para o porto – não é o menor destes oligarcas que lucram com a corrupção: a 5 de Março de 2021, o Secretário de Estado (ministro dos Negócios Estrangeiros dos EUA – NdR) Anthony Blinken, que provavelmente não teve outra escolha, anunciou que o Departamento de Estado tinha bloqueado os seus bens e o tinha banido dos EUA devido ao seu “envolvimento num caso significativo de corrupção”. É verdade que Kolomoïsky tinha sido acusado de desviar 5,5 mil milhões de dólares do Banco estatal Privatbank. Mera coincidência: o bom Ihor era também o principal accionista da holding petrolífera Burisma – onde estava empregado um dos filhos de Joe Biden, Hunter, a receber uma “modesta” compensação de 50.000 dólares por mês, o qual é agora objecto de uma investigação por parte do Procurador-Geral do Estado de Delaware nos EUA (…).

É este mesmo Kolomoïsky – sem dúvida um personagem incontornável nesta Ucrânia a caminho do progresso – que proporcionou toda a carreira de actor a Zelensky e que é citado nos Pandora Papers, revelados pela Imprensa em Outubro de 2021. Estes documentos revelaram que o canal de televisão 1+1, propriedade do oligarca sulfuroso, tinha pago nada menos do que 40 milhões de dólares à sua estrela Zelensky, desde 2012, e que este último, pouco antes de ser eleito Presidente e com a ajuda do círculo de amigos da sua cidade natal Kryvyi Rih – os dois irmãos Shefir, um dos quais é o autor dos guiões de Zelensky e o outro o chefe do Serviço de Segurança do Estado (SBU) e o proprietário da sua empresa de produção Kvartal 95 – tinha transferido, prudentemente, somas consideráveis de dinheiro para contas offshore abertas em nome da sua esposa, ao mesmo tempo que adquiria três apartamentos em Londres (sem declaração oficial) pela soma de 7,5 milhões de dólares.

Esta arte de optimização fiscal e de contacto frequente com oligarcas (os quais são, no mínimo, controversos) não abona em nada a favor de um compromisso presidencial incondicional contra a corrupção (…).

Em Fevereiro de 2021, Zelensky encerrou três canais de TV da oposição considerados pró-russos e supostamente pertencentes ao oligarca Viktor Medvedchuk (NewsOne, Zik e 112 Ucrânia). O Departamento de Estado dos Estados Unidos da América saudou este ataque à liberdade de imprensa, afirmando que os EUA apoiam os esforços ucranianos para combater a influência maligna da Rússia (…).

REPRESSÃO

Um decreto presidencial obriga todos os canais de informação a transmitir apenas uma versão dos acontecimentos – a versão do Governo, claro. Recentemente, a caça às bruxas estendeu-se até ao blogue crítico mais popular do país, o Navalny ucraniano, cujo autor Anatoliy Shariy foi detido pelas autoridades espanholas, a 4 de Maio, a pedido da Polícia política ucraniana (…).

A purga tem sido ainda mais severa para os partidos políticos. Ela já dizimou os principais oponentes de Zelensky. Na Primavera de 2021, o domicílio do principal adversário, Medvedchuk – considerado próximo de Putin – foi saqueado e o seu dono colocado sob prisão domiciliária. A 12 de Abril, este deputado oligarca foi internado à força num local não revelado, visivelmente drogado, impedido de ter visitas, antes de ser apresentado na TV e oferecido em troca os defensores da fábrica de Azovstal, desafiando todas as Convenções de Genebra (…).

Em Dezembro passado, foi a vez do ex-presidente da República, Poroshenko – que estava a subir nas sondagens – ser acusado de traição. Em 20 de Dezembro de 2021, às 15h 07m, foi escrito no site oficial do SBU que ele era suspeito de ter cometido crimes de traição e apoio a actividades terroristas. Poroshenko – apesar de ser um anti-russo fanático – foi acusado de “ter tornado a Ucrânia dependente da energia da Rússia e dos líderes das pseudo-Repúblicas sob controlo russo”.

A 3 de Março, foram os militantes da Esquerda Lizvizia que sofreram uma rusga do SBU e foram aprisionados às dezenas. Depois, no dia 19 Março, a repressão atingiu todo o conjunto da Esquerda ucraniana. Por decreto, foram proibidos onze partidos de esquerda: o Partido pela Vida, a Oposição de Esquerda, o Partido Socialista Progressista da Ucrânia, o Partido Socialista da Ucrânia, a União das Forças de Esquerda, os Socialistas, o Partido Sharyi, Os Nossos, o Bloco de Oposição e o Bloco Volodymyr Saldo.

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ADENDA

Uma reforma laboral que arrasa os direitos

Neste ano, Zelensky promulgou duas leis que constituem uma reforma laboral arrasadora dos direitos das classes trabalhadoras da Ucrânia.

A Lei 2136,“lei sobre as relações laborais em condições de guerra”, apresentada como uma medida de excepção, elimina direitos elementares dos trabalhadores ucranianos. Permite aos patrões “suspender o contrato de trabalho”, alegando motivos de força maior causados pela guerra. Podem, sem despedir o trabalhador, deixá-lo sem salário e convocá-lo para trabalhar quando for necessário. Também lhes permite não pagarem o trabalho já realizado pelo trabalhador, isto é, poderem pagar-lhe quando quiserem. Basta-lhes para isso dizer quedevido a factos relacionados com a guerranão terem podido pagar a tempo.  Da mesma forma, permite às empresas suspender os acordos colectivos de trabalho. Proíbe, também, os protestos de rua dos sindicatos.

A Lei 5371 que permite às empresastendo até 250 trabalhadoresestabelecer contratos individuais não respeitando as condições mínimas exigidas por lei, incluindo as normas mínimas da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Nestes casos, os empresários terão liberdade para negociar com o trabalhadorde forma individualos salários, as horas de trabalho e os termos do contrato. Isto afectaria, à partida, 70% dos trabalhadores, que trabalham em pequenas e médias empresas. Mas os sindicatos denunciam que as grandes empresas podem subdividir-se em pequenas empresas para beneficiar desta norma e, assim, eliminar os contratos colectivos de trabalho. Também permite ao Estado confiscar as propriedades e as sedes dos sindicatos.

Como é assinalado, pelos próprios autores que escreveram o projecto desta Lei, o objectivo é eliminar as conquistas sociais obtidas no âmbito da URSS. Para eles, as relações laborais na Ucrânia “continuam a ser reguladas pelo antiquado Código do Trabalho, aprovado em 1971 e desenvolvido sob as condições da economia de gestão soviética”.

De acordo com Nataliia Lomonosova, do “think tank” ucraniano Cedos, nos círculos governamentais comenta-se que o Estado ucraniano “não pode dar-se ao luxo de pagar a Segurança Social, as prestações laborais ou a protecção dos direitos laborais” por causa da guerra.

Zelensky e o seu Regime têm características em comum com Putin e o seu Regime. A principal, é o domínio dos oligarcas saídos do antigo partido estalinista, que vivem da pilhagem da propriedade colectiva do povo e procuram o seu lugar no mercado mundial – no caso de Zelenski, ao serviço directo do imperialismo e da NATO. E é ao serviço deles que Zelensky liquida o seu país, privatiza as terras e tenta desmantelar todas as liberdades e direitos.

A NATO e a UE dizem que defendem a Ucrânia, porque esta defende “os nossos valores”. De facto, a política de Zelensky é a expressão mais acabada dos “valores” da UE: o domínio absoluto das multinacionais, “valores” que todos os governos da UE e a NATO tentam aplicar.

Na guerra da Ucrânia só há um campo a defender: o dos povos da Rússia, da Ucrânia e de toda a Europa, que estão a sofrer as consequências da guerra.

Nem NATO, nem Putin!

Abaixo a política de guerra, nem um só euro para a guerra!

Sobre a morte de Mikhail Gorbachev

Gorbachev e Putin: ambos membros da mesma Nomenklatura.

Morreu Mikhail Gorbachev, o último líder da URSS e um dos protagonistas da sua dissolução. Após a sua morte, assistimos a um paradoxo: os órgãos de Comunicação social ocidentais saúdam, quase unanimemente, a sua memória, enquanto a grande maioria das pessoas dos países que outrora fizeram parte da URSS, que ele liderou, mostram uma clara rejeição em relação a ele, às suas políticas e ao balanço do seu mandato.

Elogios dos defensores do capital

Não é por acaso. Para os órgãos de Comunicação social ao serviço do capital, a obra de Gorbachev – que levou ao colapso e à destruição do primeiro Estado operário da História, baseado na expropriação do capital – merece todos os elogios. Já o foi solenemente expresso por uma das suas instituições de maior prestígio, o Comité do Nobel da Paz, que lhe atribuiu esse prémio em 1990.

Para o New York Times, “os primeiros cinco anos de Gorbachev no poder foram marcados por significativos e até extraordinários feitos “.

O Presidente dos EUA, Joe Biden, reagiu à notícia da sua morte com grandes elogios, à “coragem” e à “imaginação” que ele demonstrou durante o seu mandato e durante muitos anos a seguir. O Presidente francês, Emmanuel Macron, expressou as suas “condolências pela morte de Mikhail Gorbachev, um homem de paz cuja eleição abriu um caminho para a liberdade dos Russos. O seu compromisso para com a paz na Europa mudou a nossa História comum”.

Pedro Sánchez salientou que ele contribuiu, com as suas decisões, “de uma forma decisiva para terminar com a Guerra Fria e fazer da Europa, e do resto do mundo, um lugar com mais paz e liberdade”, enquanto Núñez Feijóo (1) disse, que “a paz e a liberdade sempre estarão em dívida para com ele”.

No entanto, o governo da Federação Russa decidiu não organizar um funeral de Estado, dada a controvérsia que isso poderia originar, num momento em que está a acumular-se o descontentamento com a guerra.

Um homem da Nomenklatura

Gorbachev foi, durante toda a sua vida, um homem da Nomenklatura – a burocracia que usurpou o poder, após a morte de Lenine, e que tirou partido desse poder para obter enormes benefícios materiais. Burocracia cuja ascensão ao poder significou a destruição do Partido Bolchevique (que liderou a Revolução de Outubro de 1917) e a liquidação física dos seus principais quadros dirigentes.

Em 1955, com 22 anos de idade, Gorbachev iniciou a sua carreira nesse aparelho burocrático. Entre 1955 e 1962, foi Primeiro-secretário do Comité do Komsomol de Stávropol. Em 1970, foi promovido a chefe do Comité territorial do PCUS de Stávropol. Em 1966, ascendeu ao cargo de Primeiro-secretário do Comité do Partido dessa localidade. Em 1968, foi eleito Segundo-secretário do Comité provincial do PCUS e, em 1970, tornou-se o Primeiro-secretário desse Comité.

Em 1971, tornou-se membro do Comité Central do PCUS. Em 1978, foi eleito Secretário para a Agricultura, no Comité Central do Partido Comunista. Em 1980, foi incorporado no Politburo do Comité Central, tornando-se o seu membro mais jovem (aos quarenta e nove anos). Era membro do Comité Central há 17 anos, quando foi nomeado seu dirigente máximo.

A política de Gorbachev levou à desintegração da URSS

O Regime da URSS, dominado pela burocracia, estava a atravessar uma profunda crise – a qual, em última análise, expressava a irresolúvel contradição entre o carácter social da propriedade, que exigia uma gestão democrática da economia por parte das classes trabalhadoras, e a usurpação do poder por parte da burocracia parasitária. Uma contradição que, em 1938, foi expressa da seguinte forma por Leon Trotsky: “O prognóstico político tem um carácter alternativo: ou a burocracia se transforma, cada vez mais, num órgão da burguesia mundial dentro do Estado operário, derrubando as novas formas de propriedade e devolvendo o país ao capitalismo; ou a classe operária esmaga a burocracia e abre o caminho para o socialismo”.

Quando Gorbachev assumiu o cargo de Secretário-Geral do PCUS – tornando-se, portanto, no principal representante da burocracia dominante – a crise do sistema era imparável. A gota que fez transbordar o copo foi a greve geral dos mineiros, iniciada em Julho de 1989 pelos mineiros da região de Donbass e que se propagou, como pólvora, através do Kuzbass siberiano, a cidade árctica de Vorkuta, o Karagandy do Cazaquistão e por todo o país. Uma greve que, em algumas das suas reivindicações, punha em causa o próprio poder da burocracia. A greve assumiu, em alguns lugares, um carácter insurreccional. Os comités de greve tomaram conta do funcionamento das cidades. A venda de bebidas alcoólicas foi proibida e foram criadas organizações para manter a ordem pública. Em algumas cidades, os chefes da Polícia tiveram de prestar contas – sobre a questão da ordem pública – em reuniões de massa organizadas pelos grevistas.

Aterrorizada com a perspectiva da mobilização operária, a burocracia, sob o comando de Gorbachev, lançou um programa de reformas económicas e políticas. Ele declararia, mais tarde, que tinha sido forçado a aplicar políticas “perigosas” para evitar que estalasse “uma revolução mais sangrenta que a de Outubro”. Políticas que levaram à destruição da propriedade colectiva e à desintegração da URSS.

Na esfera económica, produziu-se a apropriação da propriedade colectiva pelos chamados “oligarcas”, que eram normalmente os membros da própria burocracia que administravam o correspondente sector económico e que se apropriaram dele. Os antigos dirigentes do PCUS converteram-se em governantes dos novos Estados que emergiram do colapso da URSS. Boris Yeltsin, coveiro da URSS, era membro do Secretariado Político do PC. Gaidar, organizador das privatizações, foi durante anos colunista económico do jornal oficial do PCUS (Pravda). Kravchuck, que separou a Ucrânia da URSS, era o Secretário ideológico do PC da Ucrânia. Schevarnazde, primeiro presidente da Geórgia burguesa, era membro do Secretariado Político do PCUS.

Como Xabier Arrizabalo assinala: “A oligarquia russa insere-se no mercado mundial a partir da sua condição de proprietária das grandes riquezas do paísque são, em particular, os recursos naturaisna sequência da destruição industrial sofrida desde antes de 1991 e depois (entre 1989 e 1996 o PIB per capita caiu 45%).” (2)

Há quem afirme que Putin – valendo-se do antigo KGB e do monstruoso aparelho repressivo/administrativo – poderia ser, de qualquer forma, o continuador da URSS. Mas a realidade mostra o contrário: a sua função de saqueador e destruidor da propriedade social, o seu papel no mercado mundial como exportador de matérias-primas e a sua política militarista brutalmente agressiva (como vemos pela invasão da Ucrânia) para “defender” o seu lugar no mercado mundial, mostra o seu carácter estritamente reaccionário, por muito que se tente camuflar na defesa das populações que falam a língua russa. Putin – que, tal como Gorbachev, foi criado no seio da Nomenklatura – não é o herdeiro da URSS, mas sim da burocracia que a destruiu, e, em particular, do KGB que aniquilou milhares de revolucionários bolcheviques, a geração que fez a Revolução de Outubro.

Recordemos o discurso de Putin em que ele justifica a agressão contra a Ucrânia, acusando os Bolcheviques de terem criado esse país de forma artificial. A política de Putin confirma o papel da burocracia estalinista como agente do imperialismo no antigo Estado operário.

As consequências da destruição da URSS

Este processo implicou uma destruição formidável de forças produtivas, processo com uma dimensão nunca sentida pela Humanidade fora dos períodos de guerra. O PIB da Rússia caiu 45%, os salários foram reduzidos para metade, a pobreza passou de 2,2 milhões de pessoas, em 1987, para 72 milhões em 1995, os serviços públicos foram destruídos.

Um terço da população caiu na miséria em resultado da privatização: o consumo de carne caiu 23% e o de leite 28%.

A esperança de vida, que era de 71 anos antes do colapso da URSS, caiu para 65 anos em 2007. A população diminuiu em 3 milhões.

O balanço do mandato político de Gorbachev é a destruição da URSS e a liquidação da propriedade colectiva e das conquistas da revolução de Outubro de 1917 – substituído pelo poder dos oligarcas mafiosos, actualmente sob o controlo do sector mais duro da antiga burocracia: o KGB. O balanço económico do mandato de Gorbachev foi a miséria para a imensa maioria da população, enquanto um grupo de multimilionários mafiosos – que emergiu dessa mesma burocracia – acumulou enormes fortunas.

Na actualidade, a população russa – e, em particular, os trabalhadores – sofrem as consequências da guerra. A Duma aprovou, a toda a pressa, leis repressivas para impedir as manifestações contra a guerra.

Porém, toda a gente está consciente que o proletariado russo e a ampla massa da população – como já o fizeram no passado – regressarão à resistência aberta e às mobilizações. Na Rússia tiveram lugar as maiores revoluções nesta última época histórica: desde 1905 e, em particular, em 1917.

Mais cedo ou mais tarde, num movimento que será alimentado pelas greves que estão a iniciar-se na Europa – a partir da Alemanha, do Reino Unido ou da Grécia – o proletariado russo retomará o seu papel na luta emancipadora contra a guerra, a exploração e a opressão.

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(1) Núñez Feijóo é o Presidente do Partido Popular da Galiza e, também, o Presidente da Junta dessa Região “Autónoma” do Estado espanhol.

(2) No seu livro “Ensinamentos da Revolução Russa – Interpretação marxista da experiência soviética através de textos dos seus protagonistas”.

Tradução da Carta Semanal do Comité Central do Partido Operário Socialista Internacionalista (POSI) – Secção da 4ª Internacional em Espanha – nº 903, de 5 de Setembro de 2022