Traços gerais da Proposta de OE para 2021

A presente súmula tem por base, essencialmente, o estudo de Eugénio Rosa sobre a proposta do Governo do Orçamento do Estado para 2021, datada de 17 de Outubro de 2020.

Em relação ao trabalho e aos trabalhadores, agora à pala de virem fazer face à catástrofe económica derivada da pandemia, a proposta:

– Congela novamente os salários-base dos trabalhadores da Função Pública, mantendo a medida tomada pelos sucessivos governos nos últimos 12 anos (salvo os 0,3% de correcção salarial em 2020), período em que o índice de preços no consumidor (IPC) aumentou 11,7%;

– Congela as pensões de aposentação superiores a 659€ (e as inferiores a esse valor terão um aumento mensal de 10€ a partir de Agosto, sendo a antecipação desse aumento ao mês de Janeiro uma das “moedas de troca” para os grupos parlamentares do PCP e do PEV viabilizarem a Proposta de OE na votação geral global prevista para 26 de Novembro);

– Sobe o conjunto dos impostos em 2839 milhões € (um aumento de 6,9%), sabendo-se que os indirectos representam 56,6% das receitas totais de impostos e não têm em conta o rendimento dos contribuintes (pesando mais sobre a massa da população do que sobre a minoria com mais meios financeiros, ao contrário do que se passa com os impostos directos).

Em relação aos Serviços públicos (funções sociais do Estado) e aos seus trabalhadores, Eugénio Rosa traça o quadro seguinte: “Em 2019, o aumento dos pagamentos de despesas com pessoal (nos Serviços públicos) foi de 4,7%; em 2020, em plena pandemia, a subida diminuiu para 3,7%; e, em 2021, com ameaça de uma nova onda muito maior da pandemia, que poderá causar a ruptura dos Serviços públicos, nomeadamente de Saúde e Educação, o aumento, relativamente a 2020, é apenas de 1,9%, muito inferior ao previsto com a «aquisição de serviços a privados» (+3,4%) e com a despesa total das Administrações Públicas (+3,9%).”

Nos casos da Educação e da Saúde:

Reduz a despesa com o Ensino não superior e a Administração Escolar. Segundo Eugénio Rosa, a Proposta “prevê até uma diminuição das despesas com pessoal no Ensino Básico, Secundário e Administração Escolar de -0,1%, pois passarão, entre 2020 e 2021, de 5141 M€ para 5.137,7 M€ (Quadro 4.10, pág. 88 do Relatório do Orçamento do Estado para 2021)”;

Não reforça as transferências do OE para o SNS. Segundo Eugénio Rosa, “em 2020, a despesa do SNS financiada com receitas de impostos atingirá 10.311,2 M€ e, em 2021, será de 10.315,2 M€ (pág. 262 do Relatório OE-2021), ou seja, apenas mais 4 milhões €. É este o grande reforço do SNS tão «badalado» pelo actual Governo.”

Em relação ao conjunto da economia avizinha-se que o investimento público será insuficiente para reanimar a economia e criar emprego, pois o montante previsto é pouco superior ao consumo de capital fixo.

De facto, segundo Eugénio Rosa, “nos últimos anos o investimento realizado pelas Administrações Públicas (Central, Local e Regional) tem sido sempre inferior ao Consumo de Capital Fixo Público, ou seja, aquilo que se degrada ou destrói pelo uso e pela obsolescência. Daí a razão da degradação em que se encontram muitos equipamentos e serviços públicos (escolas, hospitais, transportes, etc.).

Em 2020, segundo dados da Conta das Administrações Públicas (contabilidade nacional) estima-se que o investimento público será inferior ao consumo de capital fixo publico em 507 milhões €, ou seja, insuficiente para compensar o que «desapareceu». Em 2021, se o investimento público previsto no Orçamento do Estado for efetivamente todo realizado (e na maioria dos anos isso nunca aconteceu devido a atrasos e cativações), mesmo assim o saldo positivo será apenas de 628 milhões €, um valor insuficiente para reanimar a economia e criar emprego.”

O que se pode pressupor sobre a discussão na especialidade da Proposta de OE?

É esta a estrutura geral, bem como as grandes linhas de força, da Proposta de OE do Estado para 2021, que foi aprovada na generalidade com o voto favorável apenas do grupo parlamentar do PS e viabilizado graças à abstenção do PCP, Verdes, PAN e das deputadas não-inscritas Cristina Rodrigues (ex-PAN) e Joacine Katar-Moreira (ex-Livre).

O que podemos esperar agora da discussão na especialidade e da votação final global?

Como tem acontecido habitualmente, vai ser usada largamente a arte da “engenharia financeira”, além da chantagem política que já foi empregue na votação na generalidade, para fazer com que esta Proposta de OE seja viabilizada “custe o que custar”, respeitando os “compromissos do Estado” com o capital financeiro e as suas instituições… sobre os quais o povo português nunca foi consultado!

Já referimos a questão do “aumento” das pensões de aposentação mais baixas, mas irá certamente haver também “uns grãos de milho” para contemplar “os animais” do PAN, bem como umas “dádivas ecológicas” para contentar este partido (e também o PEV)… caso os seus votos se tornem necessários para a viabilização final da Proposta.