Em França, para os multimilionários “viva a pandemia”!

Um relatório do Conselho Nacional de Combate à Pobreza e à Exclusão Social advertiu, no final de 2021, contra o aumento da pobreza em França, “multiplicada” desde o início da epidemia do coronavírus. Quase uma em cada cinco crianças da França está em situação de pobreza.

Todos os preços estão a subir em flecha: da electricidade, do gás, da gasolina, do óleo para aquecimento, do pão e de outros produtos alimentares. Mas os salários não estão a subir. Por outro lado, os rendimentos dos patrões estão a subir em flecha.

Em França, a fortuna dos multimilionários aumentou mais rapidamente nos dezanove meses da pandemia do que tinha aumentado em mais de dez anos!

De Março de 2020 a Outubro de 2021, a riqueza das principais fortunas da França subiu 86%, um ganho de 236 mil milhões de euros. A título de comparação, tinha aumentado 231 mil milhões em dez anos (entre 2009 e 2019). Só os cinco indivíduos mais ricos da França duplicaram a sua riqueza desde o início da pandemia: 173 mil milhões de euros. Isto é equivalente ao que o Estado já gastou durante a pandemia.

Estes cinco multimilionários possuem, agora, tanto como os 40% mais pobres de França. Como explica o porta-voz da Oxfam France: “Para os multimilionários, a pandemia tem sido uma dádiva de Deus. Ficaram mais ricos, não por causa da mão invisível do mercado, nem através de brilhantes escolhas estratégias, mas principalmente devido ao dinheiro público – pago incondicionalmente pelos governos e bancos centrais – do qual têm podido beneficiar, graças ao aumento da cotação das suas acções em Bolsa.

Ao mesmo tempo, a crise levou a um aumento da pobreza: sete milhões de pessoas – ou seja, 10% da população francesa – necessitam de ajuda alimentar, e mais quatro milhões de pessoas encontram-se numa situação de vulnerabilidade.

Em 15 de Dezembro, o presidente Macron disse, na rede televisiva TF1, que “tanto os mais ricos como os mais pobres, todos viram o seu poder de compra aumentar”.

A análise realizada pelo Instituto para as Políticas Públicas confirma que o mandato de cinco anos de Macron tem sido um acelerador das desigualdades. Os 1% mais ricos viram o seu nível de vida aumentar 2,8% em média, enquanto os 5% dos agregados familiares mais modestos perderam até 0,5% do seu magro poder de compra.

Aqui está um exemplo para nos ajudar a compreender: Bernard Arnault, o francês mais rico e o terceiro homem mais rico do mundo, possuía – em Março de 2020 – 67,3 mil milhões de euros. Em Outubro de 2021, ele possuía 163,6 mil milhões, o que representa um aumento de 96,3 mil milhões de euros.

E há quem ouse afirmar que o capitalismo e a luta de classes já não existem.

Crónica de Lucien Gauthier, publicada no semanário francês “Informations Ouvrières”Informações operárias – nº 689, de 19 de Janeiro de 2022, do Partido Operário Independente de França.

A fundação da 4ª Internacional e o seu significado actual

A decisão de fundar, em 1938, uma nova organização revolucionária internacional – nas vésperas da Segunda Guerra Mundial – foi e continua a ser criticada por muitos dos seus adversários como um acto de vaidade pessoal de Leão Trotsky. Para eles, o seu resultado final teria sido apenas a proliferação infindável de grupúsculos e seitas políticas, sem intervenção real na luta de classes.

Nada mais falso do que estes argumentos, nada mais desconectado da realidade social e económica das classes trabalhadoras, que procurava combater nas ruas ou nas trincheiras – como na Revolução Espanhola (1936-1938) – o avanço do fascismo e as consequências da crise económica capitalista.

Nos anos e décadas seguintes à fundação da 4ª Internacional – ocorrida no dia 3 de Setembro de 1938, em Paris – os inimigos de classe e os adversários políticos combateram, de maneira implacável, os seus militantes. Isso certamente porque o «Programa de Transição – A agonia do capitalismo e as tarefas da 4ª Internacional» afirmava que: “A tarefa estratégica da 4ª Internacional não consiste em reformar o capitalismo, mas sim em derrubá-lo”. A sua existência e acção atacava o coração do grande pacto que estalinistas e reformistas realizavam com as burguesias, para preservar o capitalismo, após a Segunda Guerra Mundial.

Era impossível manter-se indiferente, ou tentar ignorar e isolar a actividade política da 4ª Internacional, que agrupava agora num programa político não só a herança revolucionária

de várias gerações de militantes, mas principalmente a disposição para combater pela independência política e de acção da classe operária em defesa das suas reivindicações.

Os militantes da 4ª Internacional cruzaram o mundo, agruparam soldados alemães socialistas em plena França ocupada durante a Guerra, organizaram mineiros da Bolívia nas cavernas dos Andes, enfrentaram gangsters no movimento operário dos EUA, combateram nas fileiras do Exército Vermelho da China e nas greves do Sri Lanka, enfrentaram no Brasil a ditadura de Getúlio Vargas. Essa longa história continuou até agora e é necessário prossegui-la.

O internacionalismo

A fundação da 4ª internacional é parte de uma longa tradição de luta internacionalista dos revolucionários contra o capitalismo e que começou bem antes dela. A AIT (Associação Internacional dos Trabalhadores ou 1ª Internacional) – fundada em 1864, em Londres, a partir da acção de Marx e de Engels – uniu diferentes correntes do movimento operário europeu do século XIX, ainda pouco articulado, e continuou a sua actividade até pouco depois da Comuna de Paris (que teve lugar em 1871).

A 2ª Internacional, fundada em 1889, teve o impulso inspirador de Engels (Marx já tinha morrido) e ajudou a formar poderosos Partidos operários de massa (sociais-democratas ou socialistas) nos países industrializados e a irradiar o socialismo pelo mundo.

Com a Primeira Guerra Mundial (1914-1918) a 2ª Internacional divide-se, quando um sector reformista passa a apoiar directamente as políticas de guerra dos governos burgueses. Uma ala revolucionária – liderada por Lenine, Rosa Luxemburgo e Trotsky – opõe-se. A oportunidade histórica surge com a vitória da revolução operária na Rússia, em Outubro de 1917: dois anos depois é fundada a 3ª Internacional e surgem os Partidos comunistas.

A Revolução Russa foi cercada e atacada, sufocada numa guerra civil brutal até quase ao final de 1922. O Exército Vermelho, liderado por Trotsky, consegue esmagar “os Brancos” – contra-revolucionários sustentados por governos imperialistas e pelos antigos monárquicos e capitalistas da Rússia – mas a classe operária perdeu a nata da sua militância revolucionária durante essa guerra. Uma nova camada social de burocratas e carreiristas substitui-a e ocupa um lugar cada vez mais importante. A última batalha política de Lenine, antes de sua morte em 1922, foi contra essa burocratização do Partido e do Estado soviético.

A democracia nos Sovietes e no Partido vai desaparecendo. Em 1923, surge então a Oposição de Esquerda e, em 1926, a Oposição Unificada, para defender e recuperar a democracia interna, o livre debate e a ampliação da revolução para outros países. Estaline – a caminho de uma ditadura pessoal – inventa a pretensa teoria do “socialismo num só país” e reprime a oposição. A 3ª Internacional – cada vez mais burocratizada – vai no mesmo caminho.

Trotsky foi expulso, em 1929, da URSS e – com outros oposicionistas, de diferentes países – funda a Oposição de Esquerda Internacional, que contava no Brasil com o grupo liderado por Mário Pedrosa, intervindo como fracção no PCB (Partido Comunista Brasileiro). Essa Oposição procurava combater o estalinismo dentro dos Partidos comunistas.

Reagrupando os revolucionários no combate ao fascismo

Em Fevereiro de 1933, reúne-se uma Conferência da Oposição Internacional, após Hitler ter assumido o poder na Alemanha sem qualquer reacção do Partido Comunista alemão.

Trotsky defendia a frente única de comunistas e socialistas, como única saída para afastar o perigo fascista. Tratava-se do destino do maior núcleo organizado da classe operária mundial, nessa época. A política de divisão dos estalinistas – recusando qualquer aliança com os socialistas – abriu o caminho a Hitler, o qual, nos anos seguintes, destroçou a classe operária alemã.

A Oposição Internacional de Esquerda declarou, então, que a luta pela reorientação da 3ª Internacional chegara ao fim. Foi aprovada a “Declaração dos Quatro”, que apelava à luta pela construção de uma nova Internacional. Cinco anos depois, nascerá a 4ª Internacional.

Em 3 de Setembro de 1938, reuniu-se em Paris a Conferência para a sua fundação, com representantes de doze países: Brasil, Alemanha, EUA, França, Reino Unido, URSS, Itália, Polónia, Bélgica, Áustria, Holanda e Grécia. O brasileiro Mário Pedrosa foi delegado em nome das secções latino-americanas.

O principal documento adoptado – o Programa de Transição – afirma que as forças produtivas do capitalismo cessaram de crescer. O futuro da humanidade depende da construção da Direcção revolucionária do proletariado. O capitalismo sobrevive à custa da destruição das forças produtivas da humanidade, utilizando para isso as guerras, o desemprego e a fome.

E preconiza: “É preciso ajudar as massas, no processo das suas lutas quotidianas, a encontrar a ponte entre as suas reivindicações actuais e o programa da revolução socialista. Esta ponte deve consistir num sistema de reivindicações transitórias, partindo das condições actuais e da consciência actual de amplas camadas da classe operária e conduzindo, invariavelmente, a uma única e mesma conclusão: a conquista do poder pelo proletariado”.

A perseguição à 4ª Internacional continuou implacável, mesmo com o início da Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Na URSS, as deportações exterminaram milhares de simpatizantes. Na Europa, a GPU – polícia política de Estaline – assassinou vários dirigentes. Em 21 de Agosto de 1940, o próprio Trotsky foi assassinado no México. Mas a 4ª Internacional estava fundada e sucessivas gerações de militantes irão apropriar-se do seu programa para dar continuidade à luta pela revolução socialista.

Em 1993, a 4ª Internacional foi reproclamada e continua a actuar com as suas secções – como a corrente “O Trabalho” do PT, sua Secção brasileira – ao mesmo tempo que prepara o seu 10º Congresso mundial.

Mais do que nunca, é necessário derrubar e não reformar o capitalismo em crise, agravada pela pandemia.

Adaptação do artigo da autoria de Everaldo Andrade, publicado no jornal “O Trabalho” (da responsabilidade da Secção brasileira da 4ª Internacional), nº 890, de 27 de Setembro de 2021.

A luta contra o imperialismo, sob a pandemia

No cartaz, relativo a uma manifestação na Colômbia (a 28 de Maio), está escrito: “Se um povo protesta e marcha em plena pandemia, é porque o seu Governo é mais perigoso que o vírus”.

A nova edição de “A Verdade”, revista teórica da 4ª Internacional, traz uma análise sobre a utilização que o imperialismo faz da pandemia do Covid-19, a nível mundial, na busca de ampliar a sua ofensiva contra os direitos laborais, sociais e democráticos.

O texto evidencia que a crise económica que atinge o modo de produção capitalista, à escala global, é um processo de fundo e que vem de longe. Perante a pandemia, é usado ao nível mundial o recurso dos apelos à “união nacional”, que servem sempre para que a classe operária perca direitos, de forma definitiva, como se vê com a ofensiva em torno do teletrabalho e da uberização. Para a 4ª Internacional e as suas secções, trata-se de reforçar a organização da classe operária – de forma independente – para, a partir da defesa das suas condições de trabalho e de vida, passar da resistência à ofensiva na luta pela independência nacional e pelo fim do regime capitalista.

O número 108 da revista traz também artigos de actualidade sobre: o início do governo de Biden, nos EUA, e a impotência do seu plano para superar a crise do capitalismo; a crise política na Europa, no contexto da pandemia; e o golpe de Estado militar contra o governo de Myanmar (ex-Birmânia), país do sudeste asiático.

A edição traz, ainda, um artigo que assinala os 150 anos da Comuna de Paris, primeiro episódio da tomada do poder pela classe operária, e discute os elementos que mostram a sua actualidade.

A sempre importante luta contra a opressão das mulheres é abordada no artigo “O movimento operário e a questão das mulheres”, retomando os elementos de análise dos mecanismos usados pelo capitalismo para reduzir salários e direitos e o combate das mulheres no âmbito do combate de toda a classe operária.

Já está editada a versão original em Francês, bem como as suas traduções em Castelhano e em Inglês, estando a ser finalizada a edição em Português.