Com quase 51 por cento dos votos, o povo brasileiro deu a vitória a Lula, o principal líder do Partido dos Trabalhadores. A partir de agora, a defesa do resultado eleitoral perante as acusações de Bolsonaro fará parte da nova situação política que se está a abrir.
Em qualquer caso, esta vitória irá sem dúvida melhorar as condições para alcançar as principais reivindicações das populações.
Ao longo de toda a campanha surgiu como uma necessidade absoluta pôr fim às contra-reformas das anteriores presidências de Bolsonaro e de Temer.
Em particular a necessidade de aumentos salariais, o restabelecimento dos programas de ajuda à habitação social, de subir os orçamentos para a Saúde e a Educação, e de todas as medidas necessárias para pôr fim à situação dos mais de 30 milhões de cidadãos que passam fome. Questões que são inseparáveis do fim da privatização das empresas estratégicas e da contra-reforma do Sistema público de pensões de aposentação.
É necessária a mobilização dos trabalhadores e das suas organizações
O novo Governo vai enfrentar a dificuldade de estabelecer uma maioria parlamentar. Sem dúvida, nenhum avanço será alcançado sem a mobilização dos trabalhadores e das suas organizações.
Nos próximos dias iremos publicar o balanço que farão os nossos camaradas de “O Trabalho”, corrente interna do Partido dos Trabalhadores (PT) e Secção da 4ª Internacional no Brasil.
No cartaz da Coordenadora dos Pensionistas de Madrid, pode ler-se: “Nem um passo atrás!” / “Pensões públicas para tod@s”.
A mobilização de 15 de Outubro foi um sucesso. A Polícia municipal de Madrid estimou que cerca de 25 mil pessoas participaram; já conhecemos a generosidade da Polícia quando se trata de contar os manifestantes, pelo que falar de 40 mil pessoas a participar na manifestação não é um exagero.
O número torna-se ainda mais relevante se for contextualizado com a campanha do Governo, antes de 15 de Outubro, para esvaziar a afluência às ruas. No entanto, essa campanha foi um resultado do apelo à própria manifestação – levada a cabo pela COESPE (1) e por todas as organizações do movimento dos pensionistas – uma vez que o aumento das pensões de aposentação, para 2023, será baseado no IPC (Índice de Preços no Consumidor) acumulado até Novembro, representando um aumento das pensões em cerca de 8,5%, o que é uma boa notícia.
Contudo, não nos iludamos, o aumento médio do IPC até Setembro atingiu 9%, dado que durante a primeira metade do ano se manteve acima dos 10%; portanto, os 8,5% estão abaixo do IPC médio estimado para este ano; arrisca acontecer como em 2021, ano em que o Governo estabeleceu 2,5% como IPC médio, quando o IPC real foi de 6,5%.
Mais uma vez, e já há muitas na História, é evidente que a mobilização é a única forma de as classes trabalhadoras conseguirem as suas reivindicações. O efeito total que esta manifestação pode ter a favor do Sistema Público de Pensões continua por ver, mas ninguém pode negar o facto de que no ano passado (a 16 de Outubro) outra manifestação, muito massiva, exigiu uma auditoria às contas da Segurança Social; hoje, essa exigência está consubstanciada na Lei 21/2021: uma lei não cumprida até à data pelo Governo, no que diz respeito à sua sexta Disposição Adicional.
A manifestação de sábado 15 de Outubro não exigiu apenas que a Lei fosse cumprida e que a auditoria fosse levada a cabo. Exigiu também que o Governo retire a pretensão, que o ministro da Segurança Social tornou pública, de alargar de 25 para 35 anos o período de descontos para o cálculo da pensão, uma alteração que implicaria uma perda de 8% nas futuras pensões.
Por outro lado, e dada a subida que a acção especulativa está a causar nos preços, o apelo exigia que as pensões e os salários fossem aumentados com base no IPC real. De facto, desde o início deste século XXI tem habido uma desvalorização salarial sistemática: primeiro com a entrada em vigor do euro, depois com a crise económica e imobiliária de 2008, e agora com a pandemia e a desculpa da guerra.
Não é por acaso que, em Espanha, estamos a exigir o mesmo que os trabalhadores britânicos exigem há meses, ou o que os trabalhadores franceses exigiram em Paris, no dia seguinte à nossa manifestação: aumentos salariais iguais ao IPC, dado o quão insuportável o custo de vida se está a tornar para os trabalhadores assalariados. A diferença é que no Reino Unido e em França os sindicatos e as forças políticas de esquerda estão na linha da frente da mobilização e aqui estão ausentes.
A manifestação de 15 de Outubro foi um sucesso, mas temos de continuar a defender o Sistema Público de Pensões. Para tal, é essencial insistir na necessidade de uma auditoria às contas da Segurança Social. Se o Tribunal de Contas revelou que o Estado utilizou, indebidamente, mais de 103 mil milhões de euros em 24 anos (de 1989 a 2013), quanto dinheiro foi saqueado das pensões em 51 anos (de 1967 a 2018), que é o período que a Lei 21/2021 exige que seja analizado?
Não podemos permitir nem mais uma reforma regressiva. Foi revelada a “falsificação” que aponta o Sistema Público de Pensões como sendo inviável, uma montagem para benefício do negócio dos bancos e das companhias de seguros.
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(1) A COESPE é a Coordenadora Estatal para a Defesa do Sistema Público de Pensões.
Comunicado do Comité para a Aliança dos Trabalhadores e dos Povos (CATP)
Na semana passada concluiu-se a votação dos 5.800 empregados do armazém da Amazon em Bessemer, Alabama, sobre a proposta de constituir, ou não, o primeiro sindicato da história da Amazon nos EUA, uma campanha empreendida pelo sindicato RWDSU, que faz parte da confederação AFL-CIO. Um combate que tem importância e repercussão em todo o território dos EUA, e também para além das suas fronteiras.
Nos EUA, um sindicato só pode representar os assalariados de uma empresa ou estabelecimento se a sua maioria votar a favor de ser representada por ele. (Revogar isto foi uma promessa não cumprida de Obama). Nesse caso, são obrigados a aderir ao sindicato, ou, pelo menos (sobretudo nos Estados que proibiram a sindicalização obrigatória), a descontar para o sindicato uma quantia fixa para pagar o “serviço” que o sindicato faz por eles, negociando em seu nome.
Este sistema explica a presença de sindicatos muito poderosos em certos sectores (nomeadamente, na indústria, em particular no sector automóvel, no ensino ou nos meios de comunicação social) e a ausência total de sindicatos noutros sectores mais recentes (a informática ou Amazon, por exemplo). Em 1983, 20,1% dos trabalhadores dos EUA estavam sindicalizados; estes números tinham caído para 10,3% em 2019 (segundo os números do Instituto de Estatística do Trabalho do governo dos EUA).
Ainda não se conhecem os resultados finais desta votação, que foi uma das mais concorridas da história sindical dos EUA.
Os trabalhadores da fábrica da Bessemer, 85% dos quais são de raça negra, constituem menos de 0,5% dos trabalhadores da empresa de Jeff Bezos (o dono da Amazon), mas esta abordou o desafio sabendo que eles tinham nas suas mãos uma decisão-chave para o futuro da empresa. Até agora a Amazon – ainda que em alguns países europeus, como a Espanha ou a Alemanha, não tenha tido outro remédio senão aceitar a presença de sindicatos – tinha conseguido evitar que os seus empregados norte-americanos de fazerem o mesmo.
A campanha foi extremamente dura. A Amazon forrou inclusivamente as paredes das casas de banho com slogans como “os sindicatos não podem, nós podemos” e enviou até cinco mensagens por dia para os telefones dos seus trabalhadores, pedindo-lhes para “não abandonarem a equipa vencedora”.
Organizou também palestras, de presença obrigatória, para desacreditar os sindicatos, enquanto estes tinham que fazer campanha nos parques de estacionamento da empresa.
Ao mesmo tempo que se desenrolava esta campanha de sindicalização em Alabama, no passado 22 de Março os 40 mil trabalhadores da Amazon, em Itália, entraram em greve. Foi a primeira vez que todos os sectores da empresa pararam o trabalho e 75% dos trabalhadores de todas as categorias continuavam em greve (90% entre os motoristas-distribuidores). Entre centenas de mensagens de solidariedade, eles receberam um vídeo do Alabama, em que os trabalhadores de Bessemer, através da sindicalista Jennifer Bates, lhes fizeram chegar a sua solidariedade: “É uma luta internacional, uma luta pela justiça, estamos ao vosso lado”. Na Alemanha, os trabalhadores da Amazon há mais de 4 anos que fazem greves e mobilizações para exigir o respeito pelo contrato de trabalho do comércio a retalho. Trata-se de greves parciais, mas continuadas. Nesta mesma semana, há vários centros de distribuição que estão em greve.
Um movimento profundo
As mobilizações desencadeadas após a morte de George Floyd provocaram mudanças na situação dos EUA. Não se trata da repetição dos movimentos da década de 1960 do movimento pelos direitos civis, mas antes de manifestações que trouxeram à rua, unidos, Negros, jovens Brancos, Latinos e sindicalistas. Foram, sem dúvida, manifestações contra o racismo sistémico, mas também assumiram uma dimensão económica e social.
Utilizando a pandemia, o patronato norte-americano procedeu a uma onda de despedimentos e de reestruturações muito importante. Os Negros, os jovens Brancos e os Latinos têm, muito frequentemente, pequenos biscates ou são precários, sem direitos. Uma situação que explica a pujança dessas manifestações.
O facto de que numerosos sindicalistas e sindicatos de base tenham participado nelas foi uma indicação de que se trata de um primeiro elo de unidade entre os Negros, os Latinos, os jovens Brancos e uma parte do movimento operário organizado. Uma segunda fase deste movimento está a desenvolver-se através de uma onda de importante sindicalização, sobretudo por parte dos Negros.
Um impulso para a sindicalização
Após décadas de constante declínio da sindicalização, é espantoso ver como hoje se desenvolvem várias tentativas de constituir sindicatos em grandes empresas onde eles não existiam: a Amazon, a Google e também fábricas de automóveis no sul dos EUA.
O caso da Amazon é particularmente marcante: nunca houve nenhum sindicato em qualquer dos estabelecimentos norte-americanos desta empresa, onde as condições de trabalho são muito difíceis.
Mas seria um erro limitar este o assunto à Bessemer ou mesmo à Amazon.
Em Janeiro, 230 assalariados da Google, da sua empresa-mãe (Alfhabet) e de subempreiteiros, decidiram constituir um sindicato minoritário (que, portanto, não tem negociação directa com os seus empregadores). Segundo o jornal Washington Post, de 7 de Janeiro, este sindicato conta já com mais de 700 aderentes. Ainda que seja uma parte mínima dos assalariados da Google, é um dado significativo sobre a vontade de se voltarem para os sindicatos para se defenderem colectivamente.
A página web deste sindicato refere-se, com relevância, à campanha levada a cabo pelos professores de Chicago no ano passado para conseguirem uma melhoria do seu Acordo colectivo de trabalho.
Explica também como contactaram com o Sindicato das Telecomunicações (CWA) para pôr em marcha, conjuntamente, uma campanha para construir sindicatos no sector da Informática (digital).
Numa fábrica da Nissan, no Tennessee, foram 87 técnicos da manutenção – de entre os milhares de assalariados da fábrica – que deram o primeiro passo para construir um sindicato, enquanto esse processo foi rejeitado, por poucos votos, nas empresas da indústria automóvel deste Estado.
Dos super-explorados trabalhadores e precários dos armazéns da Amazon aos engenheiros altamente remunerados da Google, passando pelos operários especializados do sector automóvel, este impulso para a formação de sindicatos é sintomático de uma vontade da classe operária de defender a sua própria existência.
De facto, embora o número de sindicatos tenha diminuído em 2020, a sua proporção aumentou: na vaga de despedimentos que o imperialismo desencadeou, com a desculpa do Covid, os trabalhadores sindicalizados têm sido muito menos afectados do que os outros. É este impulso para a sindicalização que está em jogo, numa altura em que as grandes empresas norte-americanas se servem da pandemia para se reestruturarem de forma massiva.
Os Democratas, a começar por Biden, tentam canalizar este movimento para o quadro estabelecido das boas relações entre a confederação AFL-CIO e o Partido Democrata. É assim que Biden expressou o seu apoio ao direito dos assalariados da Amazon a se sindicalizarem, tal como o fez Bernie Sanders.
Biden anunciou medidas favoráveis aos sindicatos, contra as chamadas leis de “direito ao trabalho” (leis que, em certos Estados americanos, proíbem a sindicalização obrigatória sem autorizarem os sindicatos minoritários) e pelo respeito do direito à negociação.
Mas, embora estas medidas sejam importantes, estão longe de satisfazer as necessidades dos trabalhadores norte-americanos, sobretudo no que diz respeito ao direito ao subsídio de desemprego, aos cuidados de saúde e ao próprio salário mínimo.
A actual epidemia e a reestruturação massiva que a utiliza como pretexto colocam estas questões de forma mais aguda sobretudo entre as camadas mais exploradas. É importante constatar que este movimento está particularmente enraizado no Sul dos EUA, em locais como o armazém da Amazon em Bessemer, onde a maioria dos empregados são Negros. Junta-se assim às poderosas manifestações deste Verão que se seguiram à morte de George Floyd, no momento em que se abre o julgamento do seu assassino.
Uma vitória em Bessemer seria um ponto de apoio não só para este movimento de sindicalização, mas também para todo o movimento de resistência da classe operária contra a reestruturação em curso de todo o imperialismo norte-americano. Os sindicatos acreditam que, mesmo que percam a votação, haverá um antes e um depois de Alabama, tanto para a Amazon como para o país.
O exemplo do Google mostra que este movimento, ao mesmo tempo que procura inscrever-se no conjunto do movimento sindical, não espera o aval de ninguém para se constituir e se reforçar.
Em Espanha, são contínuos os problemas com a Amazon que, ao instalar-se aqui, quer acabar com a negociação colectiva, através da super-exploração, concedendo trabalho a falsos independentes ou mesmo entrando em confronto com milhares de pequenas empresas, às quais impõe condições leoninas para a instalação nelas de pontos de venda dos seus produtos.
Do Alabama ao Estado espanhol
No nosso país, os ataques aos direitos sindicais também têm estado muito presentes. A mobilização dos trabalhadores conseguiu que fosse a revogado o infame artigo 315.3 do Código Penal (cuja aplicação pelos tribunais impunha para a proibição dos piquetes de greve). Mas continuam de pé as reformas laborais que – através da caducidade dos contratos colectivos, da prevalência dos Acordos de empresa, da possibilidade dos empresários modificarem o que foi pactuado no Contrato e da criação de comissões de negociação sem intervenção sindical – procuram enfraquecer a capacidade de acção colectiva das classes trabalhadoras através dos seus sindicatos.
A resistência de milhares de quadros sindicais, e de muitos sectores da classe operária, travou esta ofensiva dos governos (central e das regiões) contra a organização da classe, e também obrigou os dirigentes, em muitos casos, a agir.
Os nossos sindicatos são, sem dúvida, claramente melhoráveis, os seus dirigentes são, em muitos casos, um obstáculo à acção; mas as classes trabalhadoras sabem, em Espanha e no Alabama, que precisam de ter organizações para poderem defender os seus direitos, as suas conquistas e as suas reivindicações.
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Publicado na Carta semanal nº 829 (de 5 de Abril de 2021) do Partido Operário Socialista Internacionalista (POSI), Secção da 4ª Internacional no Estado espanhol, com o título “O significado da luta dos trabalhadores da Amazon no Alabama para fundar o seu sindicato”.