A mobilização dos trabalhadores abrirá novos caminhos

Numa altura em que se agudiza o processo de destruição dos serviços públicos – e, de forma gritante, no SNS – no passado dia 7 de Julho, muitos milhares de trabalhadores dos mais variados sectores de actividade, manifestaram-se em Lisboa culminando numa concentração diante da Assembleia da República (AR), ao apelo da Direcção da CGTP.

A manifestação teve lugar enquanto, na AR, o Governo – através da sua ministra do Trabalho e da Solidariedade Social, Ana Mendes Godinho – iniciava o debate sobre a chamada “Agenda para o trabalho digno”.

Ao mesmo tempo que reconhecia a situação de precariedade e dos baixos salários dos trabalhadores, em Portugal, a ministra, tal como o resto do Governo, têm-se recusado, até hoje, a revogar as leis da caducidade da contratação colectiva, dos despedimentos colectivos, recusa extensiva aos trabalhadores precários que ocupam postos de trabalho permanentes na Função Pública, a quem têm impedido a sua admissão nos quadros do Estado.

Pode-se falar de “trabalho digno”, quando “70% do emprego criado no país em 2022 foi com vínculos precários” – como denunciou na manifestação a Secretária-geral da CGTP Isabel Camarinha?

Uma “Agenda de trabalho digno”, sem o respeito pelos direitos laborais consignados na Constituição da República – nomeadamente, a liberdade de livre negociação, o respeito por horários trabalho definidos dentro desta negociação livre e a liberdade de organização sindical dentro das empresas – é uma falácia.

Nesta manifestação vieram de todo o país trabalhadores organizados a partir das estruturas sindicais que os representam. Todos unidos no mesmo sentimento e legítima aspiração de resistirem e garantirem alguma alteração nas suas vidas, quer no aumento do salário quer na segurança do emprego, como o expressaram alguns deles, em jeito de entrevista dada aos jornalistas (ver pg. 4).

Participaram os trabalhadores das funções sociais do Estado – da Escola Pública ao SNS, bem como dos outros serviços públicos – todos imprescindíveis, a começar por aqueles que asseguram o funcionamento das instituições do Poder local.

Participaram também nesta manifestação os militantes da Associação POUS, cujos interesses não são distintos dos do conjunto dos outros trabalhadores e militantes sindicais de diferentes quadrantes político-partidários que nela participaram.

Subscrevemos as declarações de Isabel Camarinha quando afirma:

“Saímos à rua num momento em que ganha expressão o aumento da exploração. Primeiro à boleia da pandemia, agora com as sanções e a guerra, está em marcha uma tentativa de assalto aos direitos e aos salários, às pensões e aos serviços públicos.

(…) Não aceitamos a submissão à UE, repudiamos os ralhetes da Comissão Europeia e as suas recomendações que remetem Portugal para uma posição periférica na organização do trabalho e da produção, repudiamos os «conselhos» do FMI que quer fazer regressar as receitas do PSD/CDS e da tróica.”

As reivindicações gritadas pelos manifestantes de 7 de Julho são claras: o aumento do SMN para 800€ de imediato, a subida geral dos salários em 90€ e das pensões de aposentação para fazer face à escalada da inflação, o congelamento dos preços dos bens essenciais, o combate ao trabalho precário e a revogação das leis anti-laborais.

Como consegui-las?

Muitos trabalhadores, militantes e dirigentes sindicais – a partir da sua própria experiência – consideram que as manifestações não são suficientes. Sim, é necessária a mais ampla mobilização dos trabalhadores e da população, realizando reuniões e assembleias de trabalhadores por toda a parte.

Os militantes organizados em torno do Militante Socialista tudo farão para ajudar a criar das condições de uma mobilização geral, a nível nacional, que permita à maioria dos trabalhadores e das populações fazer prevalecer a sua vontade, conseguir as suas reivindicações.

A Comissão de Redacção do MS

Todo o apoio às mobilizações contra a guerra e contra a exploração

No passado dia 24 de Junho, a Guarda civil espanhola – em conjunto com a Polícia marroquina – assassinaram, no enclave espanhol de Melilla em Marrocos, dezenas de jovens africanos, pelo crime de ousarem tentar saltar as barreiras da zona marroquina para a espanhola. Eles procuravam fugir da fome, da miséria e da guerra a que os “senhores do mundo” condenaram os seus países.

O governo do Estado espanhol, chefiado pelo dirigente do PSOE Pedro Sánchez, em conjunto com o PODEMOS e o PCE, não emitiu uma única frase de solidariedade perante este horror. Afirmou, sim, que as Forças militares espanholas – em conjunto com as marroquinas – tinham cumprido a sua missão.

O mesmo Governo acolheu, nos passados dias 29 e 30 de Junho, a Cimeira da NATO, com a presença de todos os governos dos países que a integram, incluindo o chefe máximo do Estado-polícia do mundo – os Estados Unidos da América.

A sua cumplicidade silenciosa com a política do Governo espanhol, com dezenas de jovens agonizando amontoados à frente dos guardas assassinos, três dias antes desta Cimeira, mostra a hipocrisia dos “senhores do mundo”, quando evocam a guerra na Ucrânia e o seu povo eleito como mártir para reforçar, de forma obscena, o poder das bases militares da NATO nos países da Europa em armas mortíferas e em número de soldados (de 40 mil para 300 mil!).

O Presidente da República portuguesa – o grande humanista da caridade – não destoou do resto da orquestra reunida em Madrid, afirmando prontamente que o Orçamento do Estado de Portugal, para o próximo ano, terá que ter em conta este aumento de gastos militares.

Um passo em falso na estratégia partilhada entre este e o Primeiro-ministro – conscientes que estão, um e outro, da realidade do país. Ambos sabem ser necessário fazer um permanente jogo de equilíbrios, não vão os acontecimentos escapar-lhes das mãos.

Isso levou o Primeiro-ministro a defender um aumento gradual dos gastos militares e “no quadro dos Fundos recebidos de Bruxelas”. Lembremos que a presidente do BCE – ao serviço da Administração dos EUA – acaba de afirmar, em conjunto com o Governador do Banco de Portugal, que é necessária a contenção dos salários no próximo ano! Isto, depois da provocação das declarações da presidente da Comissão Europeia sobre “a exorbitância” dos 0,9% de “ajuste” dos salários da Função Pública, num contexto de subida exponencial dos preços de todos os bens essenciais, a começar pelos dos combustíveis.

Todos estes dirigentes, cúmplices pela criação da barbárie, só entendem uma linguagem – a da força das classes trabalhadoras e das populações, única capaz de impor uma viragem nos acontecimentos.

E esta força começa a crescer em vários países da Europa. Lembremos os últimos exemplos: manifestações na Bélgica, ao apelo dos sindicatos, pelo aumento dos salários e a liberdade de negociação, face à subida do custo de vida; as greves e manifestações no Reino Unido, com o mesmo objectivo; as mobilizações em praticamente todas as capitais das regiões autonómicas do Estado espanhol (estas últimas ganhando uma nova dimensão, ao expressarem a revolta perante o massacre em Melilla). Isto para já não falar do processo de agrupamento contra Macron e as suas reformas em França, através do voto de milhões de trabalhadores e de jovens, organizados a partir da França Insubmissa.

O primeiro-ministro António Costa gere a sua prática política em função do que pode acontecer também em Portugal. Apesar do apoio de todas as forças da burguesia expressas na Assembleia da República, no envio de mais armas para a Ucrânia, apesar da unidade nacional em torno do Presidente da República e da maioria absoluta do Grupo parlamentar do PS, a “unidade nacional” não existe no nosso país. Ele não pode contar com o PCP, que recusa apoiar a guerra na Ucrânia, nem com a maioria das organizações sindicais.

António Costa procura apoiar-se em acordos feitos no quadro da “concertação social”, mas a Direcção da CGTP não se compromete com tal solução. É por isso que ele a criticou, publicamente. Crítica a que a Secretária-Geral da CGTP, Isabel Camarinha, respondeu: «(A CGTP está) disponível para negociar, desde que seja para defender os direitos dos trabalhadores», sublinhando: «O que nós não fazemos é assinar acordos que retiram direitos aos trabalhadores e que não tragam melhorias».

Ao mesmo tempo, a Direcção da CGTP apela os trabalhadores de todo o país, de todos os sectores, a manifestarem em Lisboa, no dia 7 de Julho, para exigirem o aumento geral de todos os salários e pensões de reforma, de modo a compensar – de algum modo – a quebra enorme do poder de compra da maioria das famílias trabalhadoras.

Apela também à concentração, nesse mesmo dia, diante da Assembleia da República, onde será iniciada a discussão sobre a “Agenda do trabalho digno”, que a CGTP denuncia como mais um ataque do governo do PS aos direitos laborais, o qual se recusa – em continuidade com a sua política na anterior legislatura – a revogar a caducidade da contratação colectiva e a tomar as medidas que ponham fim ao trabalho precário.

Saudamos a postura da Direcção da CGTP, saudamos as mobilizações organizadas ao apelo de sindicatos de diferentes sectores, como é o caso do plenário nacional de professores e educadores, a realizar em Lisboa, a 13 de Julho, ao apelo da Direcção da FENPROF.

Saudamos também as acções de diversas populações (das Caldas da Rainha, de Alcanena,…), com as suas comissões de utentes na área da Saúde, para exigir médico de família para todos os cidadãos e a garantia da existência de serviços de urgência nos hospitais.

Saudamos a iniciativa de autarcas (sobretudo de câmaras do Alentejo), que – de forma organizada – se deslocaram a Lisboa, para questionar a Direcção da Associação Nacional dos Municípios Portugueses (ANMP), por esta ter assinado com o Governo (em nome da “descentralização”) um Protocolo que dá às estruturas do Poder Local responsabilidades que estas não poderão assumir, por falta de meios financeiros.

Estamos convictos que serão estes processos de resistência e de mobilização que – alargando-se e coordenando-se – poderão travar a política de Costa / União Europeia / NATO.

Será o seu desenvolvimento – tal como o que acontece, no mesmo sentido, nos outros países – que abrirá um caminho de paz e de progresso, desenhando um outro horizonte: o de uma união livre de nações soberanas, sem explorados nem exploradores.

Lisboa, 4 de Julho de 2022

O Secretariado da Associação por uma Política Operária de Unidade Socialista

A Espanha e o Afeganistão: Política internacional, política interna…

A retirada humilhante das forças de ocupação do Afeganistão é um reflexo claro das consequências da política imperialista. Uma política que tem tido o apoio e participação de todos os governos da Monarquia em Espanha, por detrás da administração dos EUA. O resultado de 20 anos de ocupação não podia ser mais claro: um país destruído, empobrecido, sem quaisquer direitos (as tropas ocupantes mantinham o país numa opressão sombria) opressão negra), sujeita às forças reaccionárias. Este é o verdadeiro balanço das chamadas guerras humanitárias.

Mas, como a História e os factos demonstram, há uma correspondência entre a política internacional de um Governo e a sua política interna. Quem, durante 20 anos, tenha espezinhado os direitos de uma nação inteira – neste caso, a nação afegã – dificilmente poderá levar a cabo uma política democrática no seu próprio país. Para além das proclamações “sociais”, parece frequentemente à população espanhola que existe uma continuidade entre este Governo e os sucessivos governos de Aznar, Zapatero e Rajoy.

De facto, 20 meses de Governo “progressista” têm um balanço preocupante. Nenhuma das principais reivindicações e dos direitos essenciais dos trabalhadores e das populações foram satisfeitos; além disso, a nova reforma das pensões de aposentação e o que é anunciado para a reforma laboral vão na direcção oposta ao que foi prometido.

E em termos de diálogo com a Catalunha, o que o Governo anuncia fá-lo a olhar para o Partido Popular (PP) e não para as exigências dos povos. Não é válido o argumento de que seria pior com a Direita, porque é com esta política se abre precisamente o caminho à Direita. Foi a política do Governo central que levou ao resultado eleitoral em Madrid (onde, nas últimas eleições regionais, ganhou o PP – NdT).

A resistência das classes trabalhadoras manifesta-se empresa a empresa ou em sectores tais como o aeronáutico, onde a política dos dirigentes sindicais custa a impor-se à acção dos trabalhadores e dos militantes, muitas vezes jovens. Ou, no caso dos pensionistas. Isto já levou à revogação do artigo 315.3 do Código Penal, ao indulto – parcial – dos Republicanos catalães, e ao facto do Estado ter assumido (pela primeira vez, em 80 anos) o desenterro das vítimas do Regime de Franco, ou ao aumento limitado do salário mínimo nacional (SMI – Salário Mínimo Interprofissional), mas a maioria das exigências permanece ainda estão em suspenso. Todos os dias, os trabalhadores descobrem que as suas reivindicações são repetidamente adiadas, diluídas ou ameaçadas com medidas contrárias.

Além disso, o Governo aparece cada vez mais como um joguete do capital financeiro. Basta ver o que está a acontecer com o preço da electricidade, ditado pelas multinacionais com a conivência da terceira Vice-Presidente do Governo. Este é um dos preços da pilhagem dos sectores públicos, executado de acordo com os bancos e a sua agência europeia.

É anunciado um novo ano lectivo, com aulas a metade e sem professores suficientes, com um Sistema de saúde em colapso que deixa cada vez mais sectores sem assistência, e em prol da sua privatização, com as reformas laborais ainda em vigor, o que facilita a onda de despedimentos anunciada e que já começou.

A execução dos Fundos europeus, também já iniciada, prometem uma nova vaga de desindustrialização e de desmantelamento das Administrações públicas.

O que estamos a dizer não é um exagero em relação à experiência da maioria da população. Temos de exprimir-nos de maneira clara, para ajudar à resistência a esta política, que tende a amplificar-se.

Este é o caso da marcha anunciada para Madrid das plataformas de pensionistas, exigindo uma auditoria das contas da Segurança Social, que revele as imensas verbas que o Estado deve devolver à Caixa de Pensões, e contra a aprovação nas Cortes (Parlamento) da chamada primeira tranche da reforma das pensões – aprovada pelo Governo a 24 de Agosto – ao contrário das reivindicações exigidas pelos pensionistas.

A partir deste jornal operário exortamos à participação ou apoio à mobilização dos pensionistas, a 16 de Outubro, de todos os sectores das classes trabalhadoras, da juventude e da população em geral.

Editorial do jornal Información obrera nº 361 (de 3 de Setembro de 2021), tribuna livre da luta de classes em cuja Comissão de redacção participam militantes do Partido Operário Socialista Internacionalista (POSI), Secção da 4ª Internacional no Estado espanhol.