A lucratividade grosseira da Big Pharma

Os lucros escandalosos da Pfizer com a Covid-19.

Numa declaração feita a 8 de Novembro, o CEO da Pfizer – Albert Bourla – previu que este conglomerado (que é amplamente detida por Fundos de cobertura multibilionários norte-americanos) continuará a acumular enormes lucros com a produção de vacinas Covid-19, por pelo menos mais dez anos. Ele previu que os contratos governamentais para o fornecimento de vacinas – que podem ser distribuídas, de forma justa e barata, ao público – em breve cessarão, após o que as “injeções” serão vendidas apenas para o mercado privado de Saúde a um custo de pelo menos 100 dólares por dose, em vez dos 40 dólares cobrados actualmente aos governos. Como cada dose custa menos de 2 dólares para produzir e os serviços privados são em grande parte propriedade do mesmo capital privado e Hedge-funds, parece que os pacientes particulares e possivelmente as suas seguradoras serão a fonte involuntária dessa riqueza contínua.

Mesmo com a relegação das várias variedades do Covid-19 ao status de “uma forma desagradável de gripe”, os serviços nacionais de Saúde fariam bem em garantir que as vacinas estejam disponíveis de outras fontes, para dar continuidade aos programas de protecção quase gratuitos existentes para os mais vulneráveis.

Claro, a Pfizer admite ter investido num extenso e caro programa de investigação para fornecer vacinas que serão eficazes no combate a toda uma nova gama de doenças respiratórias que estão no horizonte imediato, bem como os desenvolvimentos no tratamento de enxaquecas e diabetes. Esses novos medicamentos serão amplamente comercializados para o sector privado para trazer lucros anuais previstos de pelo menos 2 mil milhões de dólares.

As expectativas da Pfizer e, sem dúvida, as dos seus associados na Big Pharma podem fortalecer as perspectivas económicas e de saúde dos cidadãos mais ricos de nações prósperas, mas devem espalhar o desalento médico para a maioria da população global que já está a preparar-se para os desastres das Alterações Climáticas.

 A opinião de Roberto Cavaleiro, no semanário Nascer do SOL,

de 11 de Novembro 2022

“Megaincêndios na Califórnia: O aquecimento global tem as costas largas”

É “lá longe”, nos EUA?

Uma vez mais este ano, dezenas de milhares de hectares de floresta estão a desaparecer na Califórnia. A causa: o aquecimento global, certamente, mas apenas em parte. Porquequer seja em termos de prevenção de incêndios, nos recursos para combate a incêndios ou para a política de protecção das populaçõesa procura do lucro continua prioritária.

Num artigo publicado online a 31 de Julho, a Correspondente na Califórnia do jornal Le Monde salienta, com razão: “Por muito louváveis que sejam, as grandes manchetes sobre as alterações climáticas – os ‘mega títulos’, poder-se-ia dizer – que são disparadas logo que alguns hectares de terra se incendiam, têm a desvantagem de obscurecer um elemento importante do debate sobre os fogos: a sua dimensão económica. A curto prazo, prevenir e combater os incêndios é sobretudo uma questão de dinheiro. Existem formas de limitar o impacto dos incêndios, desde que paguemos o respectivo preço.” (lemonde.fr, 31 de Julho)

Esta jornalista recorda que a empresa de electricidade PG&E (Pacific Gas and Electric Company) foi considerada culpada de diversos incêndios que causaram a destruição de centenas de milhares de hectares de vegetação, de centenas de habitações e várias dúzias de mortes.

De cada vez, há faíscas provenientes de linhas eléctricas mal conservadas que pegam fogo aos arbustos. Os tribunais já condenaram várias vezes a PG&E a limpar o matagal das zonas circundantes das suas linhas, sem sucesso. Mas a empresa está empenhada em preservar as suas margens de lucro. Portanto, não faz desmatagem nem enterra as linhas eléctricas (ou apenas muito poucas). E, quando os ventos são demasiado fortes, a empresa simplesmente corta a energia aos clientes, ao mesmo tempo que lhes cobra uma sobretaxa – dita de “alterações climáticas” – para financiar as indemnizações a pagar às vítimas dos incêndios por ela provocados!

Uma vez declarados os incêndios, são necessários equipamentos e homens para os combater. O Estado da Califórnia adquiriu equipamento moderno em 2021 (os helicópteros anteriores datavam da Guerra do Vietname, isto é, de há 50 anos!), é também referido neste artigo, mas há uma tal escassez de bombeiros que a Califórnia tem de recorrer aos prisioneiros para combater os incêndios. Os bombeiros são mal pagos. “Menos de 13 dólares por hora é inaceitável”, exclamou Joe Biden em 2021. Em seguida, o presidente dos EUA aumentou o salário mínimo dos bombeiros federais para 15 dólares por hora, embora admitindo que este valor ainda era insuficiente.

Finalmente, o custo da habitação na Califórnia é tal que os reformados e os modestos assalariados não têm outra escolha senão viver, frequentemente, numa casa móvel (rulote), em zonas perigosas, no limite das florestas. Foi este o caso em Paradise, uma cidade que ficou reduzida a cinzas, em 2018, e onde 85 pessoas morreram. Sacrificadas no altar do lucro.

Notícia publicada no semanário francês “Informations Ouvrières” Informações operárias – nº 717, de 3 de Agosto de 2022, do Partido Operário Independente de França.

Marcelo receia que o “timing” da divulgação dos lucros das petrolíferas precipite a revolta social?

É mentira. O “ouvido melhor” para que o Marcelo ouve é “o direito” – o das petrolíferas e gasolineiras…

O Governo baixou o ISP (Imposto sobre os Produtos Petrolíferos) no equivalente à descida da taxa do IVA dos combustíveis de 23% para 13%, ou seja, uma redução de cerca de 20 cêntimos (1) por litro, que, segundo o Governo se traduziria numa redução de 15,5 cêntimos por litro de gasolina e de 14,2 cêntimos no gasóleo, a partir de 2 de Maio. Porém, o preço pago pelos consumidores nos postos de combustíveis quase não desceu. Ou seja, se o Estado recebeu menos 20 cêntimos por litro (de receitas fiscais) e se os consumidores pagaram praticamente o mesmo preço, o diferencial só pode ter ido parar aos cofres das petrolíferas ― engrossando as suas margens comerciais ― apropriando-se de uma receita adicional, extorquida aos consumidores.

O Governo sabe disso. Já em 21 de Julho de 2021, no debate do “Estado da Nação”, António Costa informou o Parlamento ter recebido um relatório da Entidade Nacional da Segurança Energética, onde era dito que parte significativa do aumento dos combustíveis “se explica por um abuso das margens de comercialização”.

Por isso, não pode António Costa alegar desconhecimento do aumento abusivo das margens comerciais das petrolíferas, nem tão pouco invocar o benefício da dúvida, como o fez no dia 4 de Maio, ao afirmar que o Governo iria verificar se havia “um abuso nas margens aproveitando a redução da tributação, como se essa dúvida já não tivesse sido dissipada, por ele próprio, 10 meses antes.

Para os trabalhadores, que vêem os seus salários serem devorados pela subida galopante dos preços dos bens essenciais, para as empresas que vêem as suas margens serem esmagadas pelos aumentos especulativos dos custos da energia, para os agricultores que sentem o garrote no pescoço devido ao aumento exponencial dos fertilizantes e pesticidas, para a esmagadora maioria da população é insuportável ver as petrolíferas empanturrarem-se de lucros à sua custa e o Governo a deixar correr o marfim.

Só a GALP multiplicou por 6 os lucros no 1º trimestre deste ano. Anunciou 155 milhões de lucros no momento em que, para a maioria da população, é claro que as gasolineiras aproveitam todos os pretextos, como a redução do ISP, para aumentar as margens no preço dos combustíveis e os seus lucros milionários.

É uma situação socialmente explosiva. Todos têm em mente que foi o aumento dos combustíveis que desencadeou o movimento popular, contra Macron, dos “coletes amarelos” em França.

Terá sido este receio que levou o presidente Marcelo, em declarações às televisões, a exprimir a sua “perplexidade” ― não pelas margens abusivas e lucros milionários das petrolíferas ― pelo momento (“timing”) escolhido pelas petrolíferas para divulgarem os seus resultados?

O que eles todos temem é a indignação e revolta da população contra este contraste social, em que uma minoria da sociedade se apropria e acumula lucros gigantescos ― GALP’s, EDP’s, PFIZER’s, Jerónimo’s Martins, Navigator’s,… ― enquanto a maioria que produz (ou já produziu) a riqueza ― a população trabalhadora, os pensionistas,… ― vê os seus salários e pensões de aposentação serem devorados pela subida insuportável dos combustíveis e do custo de vida.

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(1) Uma redução de 10% (23% – 13%) sobre 2€/litro = 20 cêntimos.