Mobilizações contra a guerra e a exploração

Quem pode aceitar como normal o encerramento das urgências pediátricas dos hospitais da região de Lisboa, nomeadamente do Hospital da Estefânia, ao mesmo tempo que existem cerca de 1,4 milhões de Portugueses sem médico de família?

Que política permitiu que se chegasse até este ponto?

Quem pode aceitar como normal que 40% das verbas elencadas para a Saúde, no Orçamento do Estado, sejam entregues aos privados que crescem por todo o lado, tal como cresce a habitação de luxo a que a esmagadora maioria povo não pode aceder?

Quem pode aceitar como normal que à mobilização determinada da esmagadora maioria dos professores, para exigir a correcção das políticas de destruição da sua vida profissional e da Escola Pública, levadas a cabo desde há quase 20 anos, por Maria de Lurdes Rodrigues e ministros seguintes, o Governo responda com um ataque feroz ao direito à greve?

Qual o objectivo deste braço-de-ferro? “O Governo não vê que as escolas vão ficar sem professores diplomados, já que ninguém quer ser professor com uma carreira tão desvalorizada?” – perguntam dirigentes sindicais.

Que caminho para o Portugal de Abril quer abrir um Governo assente numa maioria absoluta de deputados do PS na Assembleia da República?

O caminho do Chega, do PSD e da Iniciativa Liberal? O caminho “normal” seguido pelos governos dos EUA (Democratas ou Republicanos), onde o ensino, a saúde e os direitos sociais são de primeira, segunda e terceira ordens (consoante a capacidade económica de cada família) enquanto pululam as indústrias e os negócios alimentados pela guerra?

É este caminho que um governo do PS quer abrir, quando se submete – em conjunto com os outros governos da Europa – às exigências do imperialismo norte-americano para apoiar as forças da NATO, de forma a manter a morte e a destruição na Ucrânia?

Até quando vai continuar a enganar dizendo que esta guerra é para defender a paz e a liberdade, quando nem a NATO nem Putin pretendem tal coisa?

Na Ucrânia e na Rússia são as mães que choram os seus filhos no matadouro ou já mortos. Na Ucrânia são milhões de vidas e de sonhos promissores de paz e de civilização destruídos!

Aqui, nos outros países europeus, são as classes trabalhadoras a levantar-se para defender a sua capacidade aquisitiva a ser comida pela inflação, para tentar preservar os serviços públicos, minados por dentro através da destruição das condições de trabalho daqueles que – em número cada vez mais reduzido – fazem tudo o que está ao seu alcance para que continuem a servir as populações.

O crescimento das mobilizações contra as consequências desta política constitui um sinal de esperança no futuro de paz e de desenvolvimento da civilização.

É o sinal de que há condições para mudar positivamente a realidade negra que os senhores da guerra teimam em impor-nos. Condições concretas provadas pelos milhões de espanhóis que se levantam contra o desmantelamento do seu Sistema de saúde pública, pelos trabalhadores do Reino Unido, pela esmagadora maioria da população francesa unida com as suas Centrais sindicais, ou aqui, no nosso país, com mobilizações e greves para defender os serviços públicos – dos professores aos médicos e enfermeiros.

A greve geral da Função Pública do dia 17 de Março e a manifestação nacional, com todos os sectores (do público e do privado) no dia seguinte, serão um aviso importante ao Governo e a toda a Direita de que não será fácil derrotar a população trabalhadora portuguesa e obrigá-la a abdicar das conquistas da Revolução de Abril.

É neste contexto que militantes políticos e dirigentes sindicais reflectem sobre como ligar a luta em Portugal com aquelas que se desenvolvem nos outros países procurando abrir um caminho para todos os povos da Europa, sem guerras, sem sanções, sem desmantelamento das conquistas sociais.

 Como afirmaram professores sindicalistas, na manifestação que teve lugar no passado dia 25 de Fevereiro, em Lisboa, com o lema «Vida Justa», ao apelo de militantes de bairros periféricos e apoiada por centenas de responsáveis sindicais e políticos de todos os sectores: “Temos que juntar tudo, começar a formar comissões a nível local, com sindicatos e partidos, para restabelecer o caminho da Revolução de Abril”.

Enorme manifestação nacional dos professores

Na manifestação, realizada em Lisboa a 14 de Janeiro, participaram cerca de 70 mil professores e outros profissionais da Educação.

Os antecedentes da mobilização actual dos professores

Em 2018 – quando havia um Governo minoritário do PS apoiado no PCP e no Bloco de Esquerda – perante a decisão de uma maioria de deputados do Parlamento, que se preparava para aprovar uma medida respeitando a exigência dos professores, com todos os seus sindicatos, da contagem integral de todo o tempo de serviço trabalhado, com reflexo directo na sua carreira profissional e no seu salário, o primeiro-ministro António Costa declarou, publicamente: “Ou os professores, ou o meu Governo”. Perante essa afirmação, os deputados recuaram na sua decisão. Desde aí, a destruição das condições de trabalho e de vida dos professores – e consequente degradação do Ensino público – só se agravou. Os professores, nas escolas, sentiam-se progressivamente esmagados e injustiçados, ao ponto de muitos milhares deles terem continuado a abandonar o Sistema de Ensino público.

A imagem da vida dos docentes, na opinião pública, tem sido de tal modo desvalorizada que, neste ano lectivo, o Governo teve de recorrer à contratação de cerca de 40% de professores sem a necessária qualificação profissional, para que centenas de milhar de alunos não ficassem sem professor pelo menos a uma disciplina.

Mas, após as últimas eleições legislativas de Janeiro de 2022, a situação política mudou. O PS governa, agora, com base numa maioria absoluta de deputados e, por outro lado, não conseguiu que a maior Central sindical (a CGTP) assinasse um “Pacto social” com ele e o Patronato, embora a outra Central (a UGT) o tenha assinado. Assim, o Governo está na prática quase completamente sozinho perante o movimento de conjunto dos trabalhadores, cujas condições de vida e de trabalho não param de se agravar, tal como acontece nos restantes países da Europa. Apesar desta situação, o Governo não tem querido mudar nada na sua orientação de guerra social, no quadro da economia de guerra em que está completamente empenhado.

O Governo pretende impor a municipalização do Ensino

É neste contexto que o Governo não hesitou em anunciar mais um golpe contra os professores e a Escola Pública. Tratava-se de vincular, de imediato, um terço desses professores – através dos Conselhos Directores das Escolas, a nível local – no quadro das chamadas Comunidades Inter-municipais, destruindo o actual Concurso nacional para a colocação dos professores, assente na respectiva qualificação profissional.

A situação no conjunto das escolas, que já antes era um barril de pólvora, explodiu com o anúncio desta medida. Os professores aproveitaram a porta aberta por um pequeno Sindicato (1), que fez um pré-aviso de greve para uma forma de luta inédita: greve ilimitada. Greve à qual associou, posteriormente, os funcionários das escolas.

Em toda a parte – de Norte a Sul do país e com a ajuda das chamadas “redes sociais” – os professores começaram a auto-organizar-se, a ligar-se entre si e a fazer concentrações em frente das suas escolas (ou agrupamentos de escolas) e das Câmaras municipais das respectivas Autarquias. Tem sido um processo imparável e cuja última etapa foi a manifestação nacional do passado dia 14 de Janeiro. Nela participaram escolas inteiras de alguns pontos do país (2), com os respectivos cartazes, bandeirolas e slogans. As palavras de ordem mais gritadas na manifestação foram: “Está na hora, está na hora, do ministro ir embora!”, “A Escola unida, nunca será vencida!”.

O conjunto das direcções dos outros sindicatos – nomeadamente as da maior Federação ligada à CGTP (a FENPROF), que faz parte de uma “Plataforma sindical” alargada a mais 7 estruturas sindicais – não hostilizam estas mobilizações, afirmando mesmo que os professores têm toda a razão para lutar, mas não participam na sua organização, levando à prática um plano de acções de luta paralelas, e incluindo actualmente greves por distrito e manifestações locais que culminarão numa manifestação nacional a 11 de Fevereiro.

Entretanto, a partir de algumas escolas, os professores têm-se dirigido às direcções sindicais do sector para que estas organizem a luta em conjunto. Foi assim que duas escolas do 1º ciclo da zona de Oeiras escreveram: “Nós somos uma só classe. Então, tal como ensinamos aos nossos alunos e aos nossos filhos, apostemos na cooperação. É assim que, solenemente, nos dirigimos às direcções de todos os sindicatos que nos representam para partilharem as mobilizações em conjunto, unindo todas as nossas bandeiras.”

Por outro lado, nas negociações com o Ministério da Educação (ME) que irão ter lugar até ao final desta semana, a direcção da FENPROF exigiu ao ME que houvesse uma só mesa negocial, em vez da negociação sindicato a sindicato, o que este recusou. Por sua vez, a direcção do STOP avança com a exigência de que estas negociações tenham transmissão online, de modo a poderem ser seguidas por todos a quem elas respeitam.

A mobilização nacional continua

A 1ª greve distrital que teve lugar em Lisboa, a 16 de Janeiro, ao apelo da “Plataforma sindical”, conjugou-se com as greves que já vinham sendo realizadas com a cobertura do STOP e teve uma adesão que rondou os 90%.

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(1) Trata-se do Sindicato de Todos Os Profissionais da Educação (STOP), que foi constituído em Junho de 2018.

(2) Um conjunto de professores e funcionários de escolas de Porto Salvo, do concelho de Oeiras, manifestaram-se em conjunto. Quatro desses professores já tinham subscrito o Apelo pelo “Fim à guerra” e outros seis fizeram-no no final da manifestação. Apelo que, em Portugal, já conta agora com 150 subscritores.

Enfermeiros: Resultado de 4 dias de greve

Bandeirola na concentração nacional de enfermeiros, diante do Ministério da Saúde, no passado dia 22 de Novembro.

«Quatro dias que pesam nos nossos salários e, acima de tudo, na preocupação constante que temos com os doentes. Estamos formados para cuidar, para salvar vidas. A opção de fazer uma greve no nosso trabalho exige grande reflexão e, sobretudo, a garantia de segurança clínica de que a nossa falta não põe em perigo a vida daqueles de que cuidamos. Segurança na decisão clínica, perante os doentes que temos na nossa frente.»

São palavras do presidente do Sindicato dos Enfermeiros Portugueses (SEP), José Carlos Monteiro, ao iniciar a sua intervenção na concentração diante do Ministério da Saúde.

O SEP valoriza o facto desse Ministério já ter considerado o reconhecimento dos pontos na carreira profissional de todos os enfermeiros; o Ministério da Saúde reconhece também que tem uma dívida para com os enfermeiros, mas não assume pagá-la, afirmando não ter capacidade para o fazer.

Ao mesmo tempo discrimina os enfermeiros mais graduados profissionalmente, os que possuem especialidades na sua formação acrescida, e rompe com o direito – conquistado desde há trinta anos – de equiparação à carreira técnica superior da Função Pública.

Na concentração em frente ao Ministério da Saúde foi aprovada uma moção com o objectivo de reafirmar as exigências dos enfermeiros. A moção exige a abertura do processo negocial com vista à reposição da paridade entre a Carreira de Enfermagem e a Carreira Técnica Superior da Administração Pública; o pagamento dos retroactivos devidos desde 2018; e, ainda, que sejam contados os pontos dos enfermeiros que estiveram ou estão com Contrato Individual de Trabalho  nas PPP (Parcerias Público-Privadas); que sejam atribuídos pontos ao tempo de vínculo precário, independentemente das interrupções entre contratos; que a todos os enfermeiros Especialistas e Gestores, que transitaram a 1 de Julho de 2019 para estas categorias, lhes sejam contados todos os «pontos sobrantes»; e que aos enfermeiros com Contrato Individual de Trabalho que, em Outubro 2015, auferiam um salário superior a 1201,48 euros lhes sejam contados os pontos.

Direitos conquistados não podem ser roubados!

Tempo trabalhado, tem de ser contado!

Valorização sim, discriminação não!

Foram estas algumas das palavras de ordem mais gritadas pelos enfermeiros durante a concentração.