O Governo diz que tem “almofadas” para evitar a subida do preço da factura da luz, mas ela já aumentou 3% em Julho e irá aumentar outros 3% em Outubro.
O PSI-20 (1) tem cada vez mais energia
Quase metade do valor da Bolsa nacional já diz respeito a empresas do sector da energia, e já há nova aquisição. EDP Renováveis, EDP, Galp Energia e REN somam mais de 40% da composição deste índice e, confirmou a Euronext no passado dia, a elas se juntará a Greenvolt (o braço de energias renováveis da Altri), tornando-se assim o sector da energia grandemente hegemónico em termos de PSI-20.
O sector da energia – que, como é sabido, está nas mãos do capital financeiro internacional – é uma verdadeira pechincha. Que o digam, por exemplo, os utentes da energia eléctrica em Portugal, e não só…
Preço da electricidade atinge sucessivos máximos históricos
O preço por MgKW/hora, no passado dia 13 de Agosto, foi de 117,29 euros, no mercado ibérico de eletricidade (Mibel). A 13 de Agosto de há um ano, era de 36 euros. E, a 13 de Setembro, acabou de atingir um novo máximo de 152 euros (mais do quádruplo!).
Segundo os nossos camaradas do POSI (2): “Não há razões objectivas para explicar este aumento. Ele não só representa uma agressão contra os mais necessitados, mas é também um obstáculo para a indústria em Espanha (e também em Portugal).
(…) No seguimento do Conselho Europeu de 23 e 24 de Março de 2000 – designado por Conselho Europeu de Lisboa – (…) em Espanha, a empresa estatal Endesa (que, em tempos, teve mais de 40% do mercado) foi privatizada pelos governos de Felipe González e de Aznar.
(…) Com a privatização, foi feito um negócio ruinoso – para os cidadãos, é claro. Não só se tornou um desastre, em termos de serviço, como a conta da electricidade se tornou cada vez mais cara e os lucros multi-milionários foram para as multinacionais.
A UE disse que queria acabar com o monopólio dos Estados, e isso levou ao oligopólio de seis empresas para todos os países da UE.
E porque tudo o que eles fazem é marcado pelo caos, dá-se o caso de empresas públicas de outros países – em que o Estado é o proprietário maioritário ou mesmo o único proprietário – participarem no bolo da privatização de empresas públicas de outros Estados (como é o caso da empresa estatal italiana, a Enel, que é actualmente proprietária de 70% da Endesa).
(…) Sob pretexto de salvar o planeta, os governos dos países-membros da UE não hesitam em destruir empresas e aumentar o preço da electricidade. Estes países, os mais ricos, criaram um princípio que é o de não poluir. É aquilo a que eles chamam o “poluidor-pagador”, fixado na Cimeira ‘ecológica’ de Quioto. E, desta forma, fazem funcionar um mercado de emissões, um mercado especulativo, que permite às empresas continuarem a operar, pagando uma taxa que torna cada vez mais difícil a sua sobrevivência.
(…) Quando sublinhavam que, se o sector da energia fosse privatizado, teríamos energia mais barata e melhor serviço, eles enganaram-nos conscientemente. A única coisa que eles conseguiram foi, com a desculpa de parar com o monopólio estatal, criar um oligopólio europeu onde 6 empresas levam a maior parte do bolo e, se as coisas continuarem assim, esse oligopólio aumentará o seu peso todos os anos.
No caso de Espanha, três grandes empresas de electricidade (a Endesa, a Iberdrola e a Naturgy) ganharam, de acordo com o jornal digital Público, de 25 de Julho de 2021, 25.977 milhões de euros, num período de cinco anos (…).
Para pôr fim ao roubo no preço da electricidade é necessário entrar em confronto com a UE, nacionalizando o sector da electricidade e colocando todos os recursos energéticos ao serviço da maioria do povo. É necessário nacionalizar a geração, distribuição e comercialização de algo que é tão importante para a vida das pessoas e para a indústria.”
E, entretanto, o Tejo tem um caudal mínimo
Nomeadamente, as barragens espanholas estão a utilizar a água do Rio Tejo para a produção de electricidade, aproveitando o facto do preço da luz estar a atingir níveis históricos. A retenção de água é tal que se pode passar a pé da margem norte do Tejo para o Castelo de Almourol…
Segundo a Agência Lusa (de 24/8/2021), isso “é denunciado pelos presidentes das Câmaras de Abrantes, Mação, Vila Nova da Barquinha e Vila Velha de Ródão que defendem um caudal mínimo diário no rio Tejo, como forma de salvaguardar os ecossistemas”.
Por outro lado, o movimento proTEJO exigiu, recentemente, que o Governo recuse a distribuição do caudal mínimo semanal para o rio Tejo, acordado com as autoridades espanholas, considerando que se está a “atirar água para os olhos dos portugueses”.
“A proTEJO defende caudais ecológicos no rio Tejo e exige que o Ministério do Ambiente não aceite os falsos caudais diários que apenas satisfazem os interesses das hidroelétricas espanholas”, referiu, numa nota, o movimento ambientalista.
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(1) O PSI-20 (acrónimo de Portuguese Stock Index) é o índice que agrega as 20 maiores empresas cotadas na Euronext Lisboa. É o principal índice de referência do mercado de capitais português. É composto pelas acções das vinte maiores empresas cotadas na Bolsa de valores de Lisboa e reflecte a evolução dos preços dessas acções, que são as de maior liquidez entre as negociadas no mercado português.
(2) Lido na Carta semanal, nº 848, de 16 de Agosto de 2021, do POSI (Partido Operário Socialista Internacionalista), que é a Secção espanhola da 4ª Internacional.
Transcrevemos para Português a Carta semanal do POSI (Partido Operário Socialista Internacionalista, Secção espanhola da 4ª Internacional), nº 848, de 16 de Agosto de 2021
O preço das contas de electricidade atingiu valores escandalosos, nos últimos tempos, avivando o debate sobre o funcionamento do oligopólio que a controla. De facto, o preço por MgKW/hora, no passado dia 13 de Agosto, foi de 117,29 euros. Exactamente há um ano, era de 36 euros.
Não há razões objectivas para explicar este aumento. Ele não só representa uma agressão contra os mais necessitados, mas é também um obstáculo para a indústria neste país.
Ao mesmo tempo que o kilowatt atinge um preço de ouro, muitos bairros onde vivem as classes trabalhadoras sofreram sucessivos apagões, neste Inverno, devido à falta de manutenção das redes. Foi o caso de muitos bairros de Sevilha, do Cañada Real em Madrid,… As empresas multinacionais do sector eléctrico não estão interessadas em investir em áreas de baixo consumo, onde muitas pessoas – que não podem pagar as suas contas – são forçadas a ligar-se ilegalmente à rede eléctrica.
É de notar que a Espanha foi um dos países que teve maior pressa em privatizar empresas públicas de energia, como parte daquilo a que é chamado “a liberalização da economia”. O Conselho Europeu de 23 e 24 de Março de 2000 – designado por Conselho Europeu de Lisboa (1), utilizando a linguagem grandiloquente que precede grandes vilanias – prometia uma série de benefícios que iriam fazer da economia da União Europeia (UE) a principal economia do mundo – um pequeno salto! – e, além disso, alcançar a sociedade do conhecimento, o pleno emprego, etc.
Quem poderia opor-se? Também, obviamente, nos diziam que algumas mudanças teriam de ser feitas para serem atingidos estes objectivos. Aquilo a que eles pomposamente chamavam liberalização da economia, especialmente no sector da energia, era a questão-chave. Falavam, igualmente, em aumentar a idade para a aposentação e de outras medidas, tais como o apoio ao sector financeiro.
Em Espanha, a empresa estatal Endesa – que, em tempos, teve mais de 40% do mercado – foi privatizada pelos governos de Felipe González e de Aznar. Enquanto outros países não mostravam pressa em privatizar (na verdade, uma empresa estatal italiana, a Enel, é actualmente proprietária de 70% da Endesa), os nossos governos aceleraram o processo de privatização, como se acreditassem que isso levaria ao pleno emprego e à maior economia do mundo.
Como geralmente acontece nestes casos, o complemento das privatizações foi a colocação de vários líderes do PSOE e do PP, em posições bem remuneradas, nos Conselhos de administração das companhias de electricidade. Entre eles estavam Felipe González e Aznar, em conjunto com 24 quadros de alta patente do PSOE e do PP e de alguns nacionalistas (membros das Autonomias regionais).
O Estado mantém uma percentagem na rede eléctrica (20%, através da REE – Rede Eléctrica Espanhola), o que lhe permite nomear o presidente. Anteriormente foi Jordi Sevilla (ex-ministro das Administrações Públicas), e agora é Beatriz Corredor.
Com a privatização, foi feito um negócio ruinoso – para os cidadãos, é claro. Não só se tornou um desastre, em termos de serviço, como a conta da electricidade se tornou cada vez mais cara e os lucros multi-milionários foram para as multinacionais.
A UE disse que queria acabar com o monopólio dos Estados, e isso levou ao oligopólio de seis empresas para todos os países a UE.
E porque tudo o que eles fazem é marcado pelo caos, dá-se o caso de empresas públicas de outros países – em que o Estado é o proprietário maioritário ou mesmo o único proprietário – participarem no bolo da privatização de empresas públicas de outros Estados.
Geração, transporte, distribuição e comercialização
O mercado espanhol é constituído por quatro fases distintas. Todo o conjunto é um caos, agravado pelo processo de privatização.
1 – Existem as empresas produtoras de energia. Há as que utilizam a energia fóssil ou nucleares, e as que utilizam energias renováveis (onde estão incluídas as hidro-eléctricas, as eólicas e as fotovoltaicas). Entre as empresas que produzem electricidade em Espanha, existem 3 empresas que representam 80% do mercado (a Endesa, a Iberdrola e a Naturgy). Outras duas, a EDP e a Repsol, representam 10%; e, ainda, há cerca de 600 que produzem energia em pequenas proporções (empresas locais, cooperativas, etc.).
2 – O transporte é realizado, exclusivamente, pela empresa estatal Red Eléctrica. Está encarregue de receber a energia dos diferentes produtores, coloca-a no “depósito” estatal e, a partir daí, envia-a para os diferentes distribuidores regionais.
3 – A distribuição está de novo nas mãos, muito maioritárias, de cinco empresas (Iberdrola, Endesa, Unión Fenosa, EDP e Viesgo).
4 – Depois destas empresas tenham trazido electricidade para cada região e para cada ponto (habitação ou empresa), entram em jogo as comercializadoras. Mais uma vez, há uma grande confusão de empresas, com as grandes a deter a maior parte do negócio e o resto das empresas a procurarem um nicho, enganando as pessoas. Para o fazer, contratam pessoal que tem como objectivo convencer os utilizadores a mudar de fornecedor, prometendo-lhes descontos que normalmente se transformam em aumentos de preços.
Como é fixado o preço?
Essa fixação é feita de uma forma que é difícil de compreender. Fundamentalmente, trata-se de um processo dividido em três partes. Os impostos, que são quase 30% – entre IVA, imposto de electricidade e imposto municipal. Em seguida, o leilão do que é realmente o preço da electricidade, o qual é um processo totalmente especulativo, onde as grandes empresas podem fazer a sua própria manipulação de ofertas. A título de exemplo, o Governo abriu uma investigação sobre a Iberdrola, por causa do esvaziamento de reservatórios com o objectivo de influenciar a alta dos preços. E, por fim, uma parte importante do preço é fixado por outros itens, os custos regulados, que nada têm a ver com o custo da produção de energia. E estes custos regulados são coisas tão variáveis como a compensação às energias renováveis, compensação às empresas que garantam o consumo, subsídios para que não tenham perdas, e um montão de coisas sem sentido. Outra vergonha, uma boa parte dela em nome das alterações climáticas.
O preço final é fixado pelo último tipo de electricidade que entra na Rede. Por coincidência, este é normalmente o mais caro. Se for esse o caso, pagamos por legumes, massas e bife de lombo de vaca, tudo ao preço do bife do lombo de vaca. É fácil para as empresas multinacionais – que têm diferentes Centrais de combustíveis fósseis e de energias renováveis – colocar, no último minuto, aquele tipo de electricidade em que estão interessadas. Trata-se de um negócio completo.
Por outro lado, deve ter-se em conta que uma grande parte da energia gerada em Espanha é produzida por Centrais eléctricas alimentadas a gás. E não há gás em Espanha, pelo que este tem de ser importado. E é aí que entra em jogo outro factor: a especulação com as matérias-primas.
O sistema, imposto pela UE, atingiu um nível tal alguns que países – como a Alemanha – pediram à UE para reformar os mercados da electricidade, porque ele chegou ao ponto de gerar cenários perversos, tais como a rentabilidade do pessoal de algumas empresas depender unicamente dos tempos de escassez de electricidade. Quanto pior para todos, melhor para alguns…
Mentiram mais uma vez
Quando sublinhavam que, se o sector da energia fosse privatizado, teríamos energia mais barata e melhor serviço, eles enganaram-nos conscientemente. A única coisa que eles conseguiram foi, com a desculpa de parar com o monopólio estatal, criar um oligopólio europeu onde 6 empresas levam a maior parte do bolo e, se as coisas continuarem assim, esse oligopólio aumentará o seu peso todos os anos.
No caso de Espanha, três grandes empresas de electricidade (a Endesa, a Iberdrola e a Naturgy) ganharam, de acordo com o jornal digital Público, de 25 de Julho de 2021, 25.977 milhões de euros, num período de cinco anos, com os ajustamentos contabilísticos (valor que sobe para 29.888 milhões de euros sem eles, e ao qual devem ser acrescentadas as escassas reservas para enfrentar os investimentos em energias renováveis).
A desculpa ecológica
Sob pretexto de salvar o planeta, os governos dos países-membros da UE não hesitam em destruir empresas e aumentar o preço da electricidade. Estes países, os mais ricos, criaram um princípio que é o de não poluir. É aquilo a que eles chamam o “poluidor-pagador”, fixado na Cimeira ‘ecológica’ de Quioto. E, desta forma, fazem funcionar um mercado de emissões, um mercado especulativo, que permite às empresas continuarem a operar, pagando uma taxa que torna cada vez mais difícil a sua sobrevivência. Uma política que, em última análise, conduz ao encerramento de empresas com grande consumo de energia (sector siderúrgico, centrais térmicas, Alcoa,…) e a sua transferência para outros países com menos controlo e mais necessidades económicas. Trata-se da deslocalização das emissões poluentes.
E enquanto as empresas que poluem estão a fechar, são doados dezenas de milhões de euros para a chamada transição energética, o que implica ajudar as empresas de electricidade a mudar o seu negócio para parques eólicos e de painéis solares, os quais também criam enormes problemas, de todos os tipos, ao meio ambiente.
Nacionalizar o sector da electricidade ou criar uma empresa pública?
Nos últimos tempos, começou a ser debatida a necessidade de criar uma empresa pública que pudesse fazer frente às empresas privadas de electricidade. Muito menos apoio entre as organizações políticas e sindicais tem tido a proposta de nacionalização do sector da electricidade.
Aqueles que argumentam que, com a criação de uma empresa pública, se podem resolver os problemas, ou não conhecem a União Europeia ou simplesmente faltam à verdade. É claro que é melhor haver empresas públicas do que privadas. Pelo menos os lucros não irão para os especuladores. Mas isto não é a solução necessária para ter uma energia barata e limpa, e para garantir o fornecimento de electricidade a toda a população, bem como a continuidade da indústria e dos empregos.
O que pode uma empresa pública fazer? Ela tem de competir com as privadas, nas condições estabelecidas pela UE e aceites pelo Governo espanhol. Não iria oferecer melhores preços e, por muito que fosse pressionada, não iria baixar os preços. Para isso, seria necessário romper com a UE e os seus Tratados. A maioria dos custos vão para os prémios às energias renováveis e para várias compensações às empresas. E, agora, o dinheiro que virá da UE através dos chamados PERTE (2), irá aprofundar a privatização e o reforço do oligopólio energético. Foi para isso que eles foram concebidos.
O Governo a bufar e a sugar
O Governo mostra-se indignado com a subida do preço da electricidade. A UP (3) até ameaçou ir para as ruas: contra o Governo? Eles poderiam resolver tudo, nacionalizando as companhias de electricidade e não subordinando-se à UE.
Para pôr fim a este roubo é necessário entrar em confronto com a UE, nacionalizando o sector da electricidade e colocando todos os recursos energéticos ao serviço da maioria do povo. Nacionalizar a geração, distribuição e comercialização de algo que é tão importante para a vida das pessoas e para a indústria.
Como temos continuamente assinalado, a Monarquia e a União Europeia actuam como uma camisa de forças para impedir o desenvolvimento das forças produtivas, para impedir a plena democracia e a satisfação das reivindicações dos trabalhadores e das populações. A luta pela República deixa de ser uma exigência ideológica, tornando-se numa necessidade material para pôr fim à exploração.
(2) “Projetos Estratégicos para a Recuperação e Transformação Económica”.
(3) A “Unidas Podemos” é uma coligação de partidos, cujos principais são o Podemos e a Esquerda Unida, ambos representados no actual Governo que tem uma maioria do PSOE.