A vitória do candidato “de unidade nacional” e os seus danos colaterais

Os resultados das eleições presidenciais decorrem dos dados que foram lançados quando António Costa decidiu apoiar a reeleição de Marcelo Rebelo de Sousa na Presidência da República. O Primeiro-ministro apostou e continua a apostar na política de “unidade nacional”, para poder fazer cumprir no nosso país as orientações decididas, em conjunto com os seus pares, na União Europeia – de que Portugal ocupa actualmente a Presidência.

Recusando, em conjunto com a Direcção do PS, apresentar um candidato presidencial – susceptível de aglutinar o conjunto das forças políticas cujas raízes mergulham na luta do povo português em torno da defesa do 25 de Abril – António Costa ditou as regras de jogo das eleições para a Presidência da República.

O PCP e o Bloco de Esquerda – partidos cujas Direcções têm suportado o Governo, apesar de o fazerem de forma crítica, e por isso, são vistos por muitas pessoas como corresponsáveis pelas políticas que este tem seguido – aceitaram as regras de jogo definidas por Costa e não procuraram dar-se os meios para construir uma verdadeira alternativa à política de “unidade nacional”. E os danos colaterais deste posicionamento ficaram à vista com os resultados eleitorais.

Assim, muitos eleitores do PS (e não só) – pressionados pela chantagem de criação de “instabilidade política” – concentraram o voto no actual Presidente, enquanto outros eleitores destas mesmas áreas políticas decidiram dar o seu voto a Ana Gomes, perante a provocação salazarenta de André Ventura.

Na ausência de uma alternativa mobilizadora, este pôde à vontade explorar o legítimo sentimento de revolta de grande parte da população – cujas condições de vida se têm agravado brutalmente – e utilizar as tácticas próprias dos fascistas para dividir os mais pobres, lançando uns contra os outros (agora os ciganos e os Negros, depois serão os “privilegiados” funcionários públicos, …).

Vamos deixar que estes resultados nos impressionem?

Se o fizéssemos, perderíamos o sentido do combate que é imperioso prosseguir numa situação tão grave como a que estamos a viver.

O que nos impressiona não são as ameaças da extrema-direita, mas sim as consequências das políticas dos sucessivos governos – incluindo o actual – que levam à incapacidade de o SNS responder a um malefício natural provocado por um vírus. O que nos impressiona é ver centenas de milhares de Portugueses e Portuguesas condenados à miséria, num país depauperado pela contínua pilhagem e na “expectativa” dos dinheiros que virão da União Europeia, a aplicar sob condições decorrentes dos interesses do grande capital e não do nosso país.

Não, o perigo de destruição do 25 de Abril não vem das extremas-direitas. Ele vem das políticas que têm levado à degradação das condições de vida do povo, do desmantelamento e fecho de serviços públicos (das estações de correio, às agências bancárias e às Juntas de freguesia), da precariedade, da pobreza (silenciada ou iludida com subsídios que “os Chegas” exploram para conseguir os seus objectivos).

O perigo de destruição das conquistas do 25 de Abril vem da política de “unidade nacional”, que quer fazer engolir à população trabalhadora a destruição de mais de 1500 postos de trabalho com o fecho da Refinaria da Galp em Matosinhos, o despedimento de milhares de trabalhadores da TAP (em simultâneo com o corte drástico da sua dimensão) por imposição da Autoridade para a Concorrência da Comissão Europeia, a juntar-se a dezenas de milhares de despedimento em muitos outros sectores… como se não houvesse outra alternativa!

Que saída?

Os trabalhadores, os cidadãos, os militantes dos partidos de esquerda e os jovens – que sentiram um sobressalto com o resultado das eleições presidenciais – têm capacidade para garantir a defesa do 25 de Abril e das suas conquistas, uma defesa que exige ser retomado o caminho que este abriu.

Um caminho que exige:

– Não desistir de lutar para impor o restabelecimento do SNS, em todas as suas diversas dimensões, e que agora deve obrigar o Governo a aplicar um Plano de acção, recorrendo a toda a capacidade de serviços de Saúde instalada (pública, social e privada), um Plano de acção que tarda e que seja transparente, para que toda a gente possa ter confiança nele

– A proibição efectiva dos despedimentos

– A revogação da caducidade dos contratos colectivos de trabalho e a proibição do estabelecimento de contratos precários

– A garantia que os investimentos que o Governo vai fomentar ou apoiar, no quadro da União Europeia, para a “economia digital”, não irão servir para generalizar novas formas de trabalho precário e de escravatura

– A garantia que os investimentos, feitos em nome da “defesa do ambiente”, irão de facto servir para proteger os ecossistemas e propiciar uma vida saudável às populações.

Os militantes organizados na associação “Política Operária de Unidade Socialista” lutarão lado a lado com os trabalhadores e os militantes que estão empenhados em bater-se por estes objectivos.

O 25 de Abril não está morto e será retomado.

O Secretariado da Associação por uma
Política Operária de Unidade Socialista

Resposta à entrevista de Costa

O que está em jogo com o desmantelamento da TAP e o encerramento da GALP de Matosinhos

Na TAP:

– O despedimento de 2000 trabalhadores com contrato efectivo

– O despedimento de 1500 trabalhadores com contrato a prazo

– A redução de 25% do salário para os trabalhadores que ficam

– A entrega da TAP à Lufthansa.

Na Refinaria da GALP de Matosinhos:

– A supressão de 500 postos de trabalho directos

– A eliminação de 1000 postos de trabalho indirectos

– A destruição de um largo número de micro, pequenas e médias empresas que vivem do funcionamento da Refinaria

– A instalação de uma Refinaria de Lítio, nas instalações de Matosinhos, a partir da exploração deste minério na zona do Nordeste Transmontano, com as respectivas consequências ambientais nefastas para as populações afectadas.

Na última entrevista à Agência Lusa, António Costa não proferiu uma só palavra sobre estes acontecimentos, os quais, a terem lugar, irão aprofundar a enorme crise económica e social no país.

No entanto, lançou um apelo à estabilidade política, afirmando ser a única garantia do combate à crise sanitária do Covid-19. Não hesitando em acusar e responsabilizar todos os que se recusaram a aprovar esta orientação já materializada no Orçamento do Estado para 2021, exibindo as sondagens eleitorais como uma arma de arremesso.

Ao mesmo tempo, destaca que o seu Governo assumirá, com a Presidência do Conselho Europeu, uma política de “desenvolvimento da Europa Social” como “absolutamente essencial” para “dar confiança aos cidadãos e esvaziar a agenda do populismo”.

Será que o desencadear de milhares de despedimentos, a entrega de uma empresa como a TAP à sua concorrente alemã e a subordinação aos grupos financeiros interessados na exploração do Lítio correspondem a uma política de desenvolvimento social?

Ou, pelo contrário, a uma política de submissão às imposições da U.E., ditadas pelos imperialismos mais fortes e que o Governo Português – na Presidência do próximo Conselho Europeu – se encarregará de procurar aplicar?

Os trabalhadores da TAP e da GALP, para fazer reverter estas decisões, como exigiu o plenário de trabalhadores da GALP e a Presidente da Câmara de Matosinhos, sabem que não podem contar com a política de “desenvolvimento da Europa Social” propagandeada pelo Governo.

Eles sabem, pela sua própria experiência de luta ao longo dos últimos anos, que só a mobilização unida dos trabalhadores – em torno das suas organizações sindicais, das Comissões de trabalhadores e das Forças políticas que se reclamam da defesa dos seus direitos – poderá impedir os despedimentos, defender os postos de trabalho e manter as empresas.

O que se joga hoje na TAP e na GALP de Matosinhos diz respeito a todos os trabalhadores deste país. É o nosso futuro que está em causa.

É preciso o envolvimento de todos, com os nossos Sindicatos, Centrais Sindicais, Forças políticas e Movimentos sociais, para impedir este crime contra o país e os seus trabalhadores.

Lisboa, 8 de Janeiro de 2021

A Comissão de Redacção do Militante Socialista

Quando se lança cuspo para o ar, ele volta a cair-nos no nariz

Desde o início da pandemia, o presidente Macron, o Governo, as “autoridades científicas” e o inefável Salomon (o número 2 do Ministério da Saúde) têm afirmado, repetidamente, que os Franceses são os responsáveis pela propagação do vírus, que não respeitam as normas de segurança, que são indisciplinados, etc.

O presidente da Assembleia Nacional (Parlamento) Richard Ferrand – um político próximo de Macron – afirmou, a 29 de Outubro: “Se estivermos doentes amanhã, é porque, a dada altura, não fomos tão cuidadosos como deveríamos ter sido. O que significa que podemos não ter lavado bem as mãos, que não mantivemos a máscara posta sempre que era necessário. Cada um de nós deve estar atento aos outros e a si próprio.”

A 17 de Dezembro, o Sr. Ferrand, por causa de contacto, colocou-se em isolamento. Na verdade, ele tinha participado, alguns dias antes, num jantar particular no Palácio do Eliseu, às 20 horas, que reuniu mais de dez pessoas (1), enquanto, recordemos, as recomendações das “autoridades científicas” são de um máximo de seis durante uma refeição, para já não mencionar o recolher obrigatório.

De facto, o Presidente Macron está doente, pois apanhou o Covid-19. Ele está em isolamento domiciliário em La Lanterne, Pavilhão de caça que não fica muito longe do Palácio de Versalhes, a casa dos reis. O Sr. Ferrand colocou-se em isolamento por ter contactado com Macron e por medo de contaminar os membros do Parlamento, particularmente no restaurante da Assembleia Nacional. Ah sim! Lembre-se que se os restaurantes estão fechados, o da Assembleia Nacional permanece aberto.

Que mundo pequenino! Desde 2017, eles já eliminaram 7.500 camas hospitalares e – utilizando a pandemia – estão a despejar centenas de biliões de euros nos bolsos dos patrões, caucionam os planos de reestruturação e de despedimentos, atirando para a rua milhões de trabalhadores, precários, estudantes, comerciantes, artistas,… Estes, quando ficam doentes, não têm o Pavilhão La Lanterne para se isolar. Isto passará, isto passará…

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(1) Entre as quais estava o primeiro-ministro do Governo português, António Costa.

Nota de Lucien Gauthier publicada no Suplemento ao semanário francês “Informations Ouvrières” – Informações operárias – nº 635, de 22 de Dezembro de 2020, do Partido Operário Independente de França.