Marcelo receia que o “timing” da divulgação dos lucros das petrolíferas precipite a revolta social?

É mentira. O “ouvido melhor” para que o Marcelo ouve é “o direito” – o das petrolíferas e gasolineiras…

O Governo baixou o ISP (Imposto sobre os Produtos Petrolíferos) no equivalente à descida da taxa do IVA dos combustíveis de 23% para 13%, ou seja, uma redução de cerca de 20 cêntimos (1) por litro, que, segundo o Governo se traduziria numa redução de 15,5 cêntimos por litro de gasolina e de 14,2 cêntimos no gasóleo, a partir de 2 de Maio. Porém, o preço pago pelos consumidores nos postos de combustíveis quase não desceu. Ou seja, se o Estado recebeu menos 20 cêntimos por litro (de receitas fiscais) e se os consumidores pagaram praticamente o mesmo preço, o diferencial só pode ter ido parar aos cofres das petrolíferas ― engrossando as suas margens comerciais ― apropriando-se de uma receita adicional, extorquida aos consumidores.

O Governo sabe disso. Já em 21 de Julho de 2021, no debate do “Estado da Nação”, António Costa informou o Parlamento ter recebido um relatório da Entidade Nacional da Segurança Energética, onde era dito que parte significativa do aumento dos combustíveis “se explica por um abuso das margens de comercialização”.

Por isso, não pode António Costa alegar desconhecimento do aumento abusivo das margens comerciais das petrolíferas, nem tão pouco invocar o benefício da dúvida, como o fez no dia 4 de Maio, ao afirmar que o Governo iria verificar se havia “um abuso nas margens aproveitando a redução da tributação, como se essa dúvida já não tivesse sido dissipada, por ele próprio, 10 meses antes.

Para os trabalhadores, que vêem os seus salários serem devorados pela subida galopante dos preços dos bens essenciais, para as empresas que vêem as suas margens serem esmagadas pelos aumentos especulativos dos custos da energia, para os agricultores que sentem o garrote no pescoço devido ao aumento exponencial dos fertilizantes e pesticidas, para a esmagadora maioria da população é insuportável ver as petrolíferas empanturrarem-se de lucros à sua custa e o Governo a deixar correr o marfim.

Só a GALP multiplicou por 6 os lucros no 1º trimestre deste ano. Anunciou 155 milhões de lucros no momento em que, para a maioria da população, é claro que as gasolineiras aproveitam todos os pretextos, como a redução do ISP, para aumentar as margens no preço dos combustíveis e os seus lucros milionários.

É uma situação socialmente explosiva. Todos têm em mente que foi o aumento dos combustíveis que desencadeou o movimento popular, contra Macron, dos “coletes amarelos” em França.

Terá sido este receio que levou o presidente Marcelo, em declarações às televisões, a exprimir a sua “perplexidade” ― não pelas margens abusivas e lucros milionários das petrolíferas ― pelo momento (“timing”) escolhido pelas petrolíferas para divulgarem os seus resultados?

O que eles todos temem é a indignação e revolta da população contra este contraste social, em que uma minoria da sociedade se apropria e acumula lucros gigantescos ― GALP’s, EDP’s, PFIZER’s, Jerónimo’s Martins, Navigator’s,… ― enquanto a maioria que produz (ou já produziu) a riqueza ― a população trabalhadora, os pensionistas,… ― vê os seus salários e pensões de aposentação serem devorados pela subida insuportável dos combustíveis e do custo de vida.

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(1) Uma redução de 10% (23% – 13%) sobre 2€/litro = 20 cêntimos.

A Galp é uma empresa cotada em Bolsa…

Para ela o que é determinante é a realização de lucro e sua distribuição pelos accionistas.

A Galp, em conjunto com a EDP, integra o grupo das empresas que mais têm sido valorizadas à custa da especulação com os preços da energia, com todas as consequências que isso acarreta, tanto para o poder aquisitivo das populações, como para o aumento dos custos de produção das outras empresas.

No período 2008-2019, o Grupo Galp teve 4198 milhões de euros (M€) de lucros líquidos e distribuiu aos accionistas 3227 M€.

Em 2020, distribuiu pelos accionistas 600 M€ e despediu 80 trabalhadores. Em Dezembro desse ano, anunciou ao Mercado de Valores Imobiliários o encerramento da sua Refinaria de Matosinhos.

Em Abril de 2021, concretizou esse anúncio, destruindo o emprego directo de 400 trabalhadores e indirecto de outros mil funcionários de pequenas empresas que viviam da relação com a Refinaria. Ao mesmo tempo, anunciou um lucro de 166 M€, no primeiro semestre deste ano. E, no dia 22 de Setembro, foi a empresa mais valorizada (4%) na Bolsa de Valores de Lisboa.

Não ao prolongamento do estado de emergência

As recentes mobilizações de mais de um milhar de trabalhadores da Groundforce de todo o país, nomeadamente em Belém e junto à sede da empresa, foram decisivas para conseguir impor o pagamento total dos salários do mês de Fevereiro e garantir a manutenção da empresa e dos respectivos postos de trabalho.

Foram seguramente estas mobilizações que obrigaram o ministro das Infraestruturas e da Habitação a ter de confirmar, como diz o Editorial do jornal Público, de 24 de Março, que Alfredo Casimiro pagou 3,7 milhões de euros por 50,1% da Groundforce depois de ter recebido da empresa 7,6 milhões de comissões de gestão.

Mas essas mobilizações constituem, igualmente, uma referência política para as dezenas e centenas de milhares de trabalhadores de outros sectores ameaçados e atingidos por despedimentos massivos – como na Banca, na Hotelaria e outros que se perfilam – ao mostrarem que o caminho é o das decisões tomadas em plenário, integrando e acompanhando as ORTs nas próprias negociações, rompendo com as lutas formatadas pelos aparelhos político/sindicais para “marcar o ponto”.

Situação que, de imediato, não escapou à análise do Presidente da República, adepto fervoroso de uma política de “unidade nacional”, destinada a manter aquilo que ele designa como um clima de “paz social”. Desde o início da semana que ele anunciou, sem margem para dúvidas, a necessidade de prolongar o estado de emergência “pelo menos até meados de Maio, mas seguramente até final de Maio”.

Posição em que foi acompanhado, imediatamente, por António Costa, o qual declarou (Público,23 de Março): “É esse o entendimento do Governo”, defendendo a manutenção deste regime excepcional até ao final da reabertura da economia, “para garantir que todos os passos são dados com segurança jurídica”.

Passos, como por exemplo a autorização do Governo dada à Galp, após o Ok da Comissão Europeia, para transferir para a Allianz Capital Partners (ACP) as concessões das redes de distribuição de gás natural, confirmando esta gestora de activos do grupo Allianz como o maior operador de distribuição de gás do país.

O mesmo grupo Galp que pretende encerrar a Refinaria do Porto, sendo suprimidos 500 postos de trabalho directos, eliminados 1000 empregos indirectos e destruída toda uma quantidade de micro, pequenas e médias empresas que vivem do seu funcionamento, na região de Matosinhos, e por isso contam com o apoio da autarquia.

A política de “unidade nacional” entre a Presidência da República, o Governo e os partidos que vêm assegurando a “paz social” – de submissão aos interesses do capital financeiro, que as instituições da União Europeia veiculam – não pode ser posta em causa na rua!

Daí a necessidade do prolongamento imediato do estado de emergência.

Com este estado de emergência decretado pelo Presidente da República estão parcialmente suspensos os direitos de deslocação em qualquer parte do território nacional e de circulação internacional, bem como os direitos dos trabalhadores,… e estão impedidos actos de resistência às autoridades em execução das normas adoptadas neste quadro de excepção.

Segundo os defensores da política de “unidade nacional” é este quadro que é preciso institucionalizar.

O negócio escandaloso das vacinas trouxe á luz do dia o papel assumido pelos diferentes governos dos países-membros da União Europeia, mostrando a sua subordinação aos interesses financeiros dos imperialismos mais fortes, deixando de forma dramática para segundo plano a vida das populações e dos povos.

Por isso, o governo de António Costa é obrigado a apostar no prolongamento do estado de emergência, em vez de responder – investindo no SNS – aos 54000 utentes que, em Janeiro, aguardavam há mais de um ano por uma cirurgia, ou de investir no SNS, recrutando os enfermeiros necessários para assegurar os mais de 150 postos de vacinação em massa, se o objectivo fosse na realidade atingir rapidamente a imunidade de grupo.

Os militantes agrupados em torno de “O Militante Socialista” – que, com outra forças políticas e sindicais, têm participado nas acções de mobilização contra os despedimentos e pela defesa dos postos de trabalho – consideram que é preciso prosseguir e reforçar o movimento de mobilização solidária com os trabalhadores da Groundforce, da TAP, da Galp, Efacec, Banca,…

E por isso, condenam o prolongamento do estado de emergência.

A Comissão de Redacção do MS