
Partida de reservistas de Sebastopol (Crimeia), a 29 de Setembro, na sequência da mobilização “parcial” decretada por Putin a 21 de Setembro.
Quando petições, revoltas e mobilizações de soldados se multiplicam no país, recebemos a seguinte correspondência da Rússia sobre este assunto.
As revoltas na frente são, sem dúvida, uma parte integrante de qualquer guerra, quando pessoas comuns são enviadas para lá.
A “mobilização parcial” foi organizada de forma descentralizada: as regiões foram obrigadas a fornecer um certo número de recrutas e a equipá-los com armas e uniformes. Em São Petersburgo, os mobilizados foram obrigados a comprar os seus próprios coletes à prova de bala, um kit de primeiros socorros e um capacete!
Timothy vive em Samara. Antes da guerra, ele tinha opiniões comunistas, mas em geral as suas opiniões não formavam um sistema coerente e foram sujeitas à propaganda Z (1): por isso, ele não resistiu à mobilização. Assim, Timothy foi colocado na fronteira com a Ucrânia. Teve sorte: ele e os seus camaradas estavam num quartel, não na floresta, como aconteceu com outros dos seus compatriotas que habitavam perto de Samara. Os mobilizados foram alimentados por voluntários, dormiam no chão, no início não havia camas.
Duas semanas mais tarde, foram enviados para território ocupado. Timothy explica que eles escavaram trincheiras, tinham falta de comida e não havia tendas para dormir.
Desde o início da “mobilização parcial”, Putin atribuiu aos governadores regionais responsabilidades adicionais, sem qualquer aumento de financiamento, de modo que quaisquer deficiências possam sempre ser atribuídas à incompetência e à cobardia das autoridades federais.
Por exemplo, Gena, da aldeia de Chuvashia, mobilizado imediatamente após o Decreto de Putin de 21 de Setembro, foi levado com vários outros rapazes da sua aldeia para um Centro de treino militar noutra região. Acabou por ir parar à cidade de Ulyanovsk.
Os órgãos de Comunicação social estavam ao corrente do desencadear de um motim nesta cidade e das exclamações dos soldados no local na parada: “Hamar yal!” (“Resistemos unidos!”, em Chuvash), mas relataram que a causa da rebelião eram apenas os interesses financeiros dos mobilizados. É a essência dos órgãos de Comunicação burgueses no sentido de difamar a rebelião.
Na sua chegada ao Centro de treino, os mobilizados moviam-se livremente na Unidade, enquanto os comandantes estavam constantemente bêbados. Eram alimentados apenas uma vez por dia, por organizações voluntárias. Os seus quartos não eram aquecidos durante a noite.
Os tumultos começaram no dia em que um Oficial superior veio fazer uma inspecção. Todos os homens estavam alinhados na parada. Ele começou por insultar os camponeses, alegadamente pela falta de disciplina e de ordem no Regimento. Um soldado gritou: “Onde estavas antes, grande focinho?”! O Oficial perguntou: “Quem gritou isso? Onde está esse canalha?! Não receberá a sua ração alimentar!”. Outro soldado respondeu: “Já não comemos nada aqui há uma semana!”. E outro acrescentou: “Talvez possas ficar a viver connosco aqui no quartel!?”.
Depois houve os insultos do Comandante, que foram interrompidos pelos gritos unânimes dos soldados: “Hamar yal!”. Em seguida, o Comandante partiu.
Os oficiais subalternos tentaram acalmar os soldados, dizendo que se eles se queixassem seria pior, porque o Comandante da Unidade era responsável por ela. E que a única coisa a fazer seria exigir dos governadores o pagamento do salário prometido por Putin de duzentos mil rublos [cerca de 3188 euros]. Com este dinheiro, seria possível comprar comida, colchões novos, cobertores, etc. Mas os soldados não se acalmaram.
Depois do cair da noite, as Forças especiais armadas com bastões intervieram. Foi exigido, através de um altifalante, que os soldados regressassem aos seus quartos. A sua acção é qualificada como criminosa e os culpados serão julgados por um Tribunal militar.
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(1) Símbolo da nova identidade nacional e ideologia russas.
Notícia publicada no semanário francês “Informations Ouvrières” – Informações operárias – nº 732, de 16 de Novembro de 2022, do Partido Operário Independente de França.