Da pandemia aos despedimentos: todos no mesmo barco?

Em França, pelo menos um milhão de empregos foram destruídos em 2020… Em todo o mundo foram 255 milhões, de acordo com os números da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

Os planos de reestruturação mais violentos do capital – para os quais milhões de milhões de trabalhadores estão a ser atirados através dos chamados “pacotes de relançamento” – estão em curso nos mais diversos sectores (aeroespacial, automóvel, vestuário, turismo, comércio, etc.)

E ainda não vimos tudo. Para tomar apenas o exemplo alemão, de acordo com Manfred Schoch, presidente do Conselho de Administração da empresa BMW, com a implementação das novas normas europeias para 2025 “haverá desemprego no sector automóvel e nos seus subcontratantes, como nunca vimos antes; na Alemanha será da ordem dos 5 milhões de empregos” (Frankfurter Allgemeine Zeitung, 26 de Fevereiro).

Por um lado, com os chamados estados de emergência os governos de dezenas de países têm atacado as liberdades democráticas e os direitos sindicais, levando a uma rejeição crescente; por outro lado, várias iniciativas estão a ser tomadas para construir um consenso que leve à aceitação da reestruturação do capital… Dizem-nos que não teríamos outra escolha, para salvar o planeta.

UM CAPITALISMO INCLUSIVO?

O Papa instituiu um “Conselho para um capitalismo inclusivo”. A riqueza do conjunto dos seus membros, dirigentes das maiores corporações do mundo, vale 10500 mil milhões de dólares… Eles devem “servir o bem comum”, “para que a economia e as finanças regressem a uma abordagem ética”… “Os membros do Conselho assumem compromissos concretos, compromissos alinhados com os pilares do Conselho Empresarial Internacional do Fórum Económico Mundial para a criação de valor sustentável – pessoas, planeta, princípios de governação e prosperidade – e que fazem progredir os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas.” (Site do Conselho). Não lhes deve custar muito… e se for para o bem do planeta… O “bem comum”, a nova palavra de ordem para acompanhar os planos do capital: vacina “bem comum”, planeta e transição ecológica “bem comum”, “diálogo social, bem comum”, etc.

É compreensível que a Secretária-Geral da Confederação Sindical Internacional (CSI), Sharan Burrow, tenha sido convidada a participar no Conselho não devido à sua fortuna, mas a fim de partilhar a mensagem com as organizações sindicais filiadas, o que ela fez: “O Conselho para um capitalismo inclusivo com o Vaticano (é) uma nova parceria histórica entre alguns dos maiores líderes mundiais do investimento e do comércio e o Vaticano. ” (Março 2020, website da CSI).

Mesmo acompanhados pela Secretária-Geral da CSI, eles terão dificuldade em fazer alinhar todas as organizações filiadas. O facto é que a CSI criou um Centro para uma Transição Justa que “juntará e apoiará sindicatos, empregadores, empresas, comunidades e investidores no quadro do diálogo social, com vista a desenvolver planos, acordos, investimentos e políticas para uma transição rápida e justa para um mundo sem carbono e sem pobreza” (website da CSI).

ZERO-CARBONO, ZERO-INDEPENDÊNCIA DE CLASSE?

Liaisons sociales (1) informa-nos: “A Primavera Ecológica, «o primeiro eco-sindicato da história», realizou o seu congresso fundador a 7 de Março, com a ambição de romper com o «produtivismo» que, segundo ele, continua a atravessar o mundo sindical (…). O eco-sindicato também quer falar de «decrescimento selectivo», quando «muitos trabalhadores terão de mudar de emprego», e quer sair do confronto entre trabalhadores e patrões, e convidar a sociedade civil para a mesa das negociações nas empresas.”

Um vasto programa corporativista, mas eles não inventaram nada. A fundação deste sindicato grupuscular poderia ser considerada anedótica; mas, não sem razão, Liaisons sociales insiste na “revolução verde” em curso nos sindicatos e naquilo que está em jogo. Que Laurent Berger (2) sublinhe as suas convergências com o eco-sindicato, propondo que se juntar a eles, está no genoma da CFDT.

Mas a reacção de um membro do Comité Executivo Confederal da CGT, citado por Liaisons sociales, é questionável: “É mais interessante fazer um trabalho nas organizações existentes, numa paisagem que já está bastante fragmentada em França. A CGT criou, recentemente, com o Greenpeace e outros o colectivo «Nunca mais isto».”

É bom reflectir a partir dos factos: a destruição de milhões de empregos, e as suas consequências, os ataques contra os direitos dos trabalhadores, não podem ser apagados com uma camada de tinta verde. A luta de classes é uma realidade e a independência das organizações continua a ser indispensável, tanto hoje como no futuro.

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(1) Ligações sociais: trata-se de um Grupo de imprensa francês.

(2) É o Secretário-geral da Confederação sindical CFDT.

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Análise de Jacques Diriclet publicada no semanário francês “Informations Ouvrières” – Informações operárias – nº 646, de 17 de Março de 2021, do Partido Operário Independente de França.

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