Em Portland, mães constituíram uma “parede” à frente da manifestação para proteger os manifestantes da Polícia. No cartaz pode ler-se: “As mães dos Negros contam”.
Para pôr fim aos “motins” associados às manifestações “Black Lives Matter” (As vidas dos Negros contam), Donald Trump ameaça enviar tropas dos Serviços de Polícia federais para toda uma série de grandes cidades lideradas pelos Democratas, citando em particular Portland, Oakland, Chicago e Los Angeles.
Ele já concretizou a sua ameaça em relação a Portland, situada na Costa Oeste. Prisões selvagens – feitas por polícias sem uniforme da CBP (a Polícia das fronteiras) e do ICE (os Serviços da imigração, temidos e odiados pelos Latinos pelas suas investidas musculadas contra os clandestinos para os expulsar) – têm tido lugar em Portland desde há várias semanas. Os Democratas protestam contra estes atentados à estrutura federal dos EUA, onde as prerrogativas da Polícia – salvo em domínios bem definidos – são apanágio dos Estados ou das municipalidades.
Isto permite a cada campo tentar agrupar os seus eleitores, tendo em vista a eleição presidencial do próximo mês de Novembro: para Trump e os Republicanos, as pessoas idosas, os Brancos mais pobres e os reaccionários convictos; para Biden e os Democratas, os jovens, os Negros, os Latinos, os progressistas moderados… Mas sobre a questão de fundo, Democratas e Republicanos estão de acordo: é preciso que as manifestações cessem, sem nada a pôr em causa a posição da Polícia no Sistema político dos EUA.
Assim, o Presidente da Câmara democrata de Oakland declarou, após uma manifestação, que “o vandalismo” (que se tinha traduzido por alguns reclames e montras quebrados, assim como por um início de incêndio rapidamente dominado) “dá a Donald Trump as imagens que ele deseja e a justificação que procura para enviar as tropas federais para as cidades norte-americanas”. Trata-se da manobra habitual, que consiste em exibir algumas montras quebradas para dividir os manifestantes, acusando-os de apoiarem “vândalos” que estariam a fazer o jogo de Trump e dissuadindo-os de se manifestarem.
Portland é uma cidade com uma grande maioria de Brancos; com apenas 6,3 % de Negros, é das grandes cidades dos EUA aquela em que existem menos Negros. O jornal International New York Times, datado de 27 de Julho, relata uma piada, que circula na comunidade dos Negros da cidade, segundo a qual “há mais cartazes Black Lives Matter em Portland do que Negros”. E contudo, durante dois meses, os manifestantes têm continuado a desfilar todos os dias contra a violência policial de que os Negros são alvo, entoando os nomes das vítimas das violências policiais. Para tentar apaziguar os manifestantes, o Presidente da Câmara de Portland decidiu reduzir em 15 milhões de dólares o financiamento da Polícia. Mas isso não foi suficiente para os manifestantes: é todo o Sistema policial norte-americano, baseado num racismo sistémico, que eles denunciam. Foi aliás a repressão das manifestações pela Polícia de Portland – não pelas tropas federais – que levou grupos de mães de família a decidirem enquadrar os manifestantes e a constituírem “paredes de mamãs” para os proteger dos golpes de matraca, de balas de borracha e de gás lacrimogéneo.
Enquanto o desemprego cresce de forma exponencial e o Governo federal se apresta para dividir por três os subsídios de desemprego excepcionais que tinha concedido no contexto da crise económica – ao mesmo tempo que os Democratas mandam matraquear os manifestantes nas cidades que dirigem e consagram toda a sua energia a explicar-lhes que, se elegerem Biden daqui a três meses, os problemas por eles levantados serão resolvidos –os jovens brancos, negros e latinos continuam a manifestar-se, com o apoio das mães de família.
As manifestações retomam vigor em toda uma série de cidades. Se os Democratas tentaram reduzir as manifestações à palavra de ordem “defund the police” (“reduzir o financiamento da Polícia”), o exemplo de Portland e de muitas outras cidades – em que cortes orçamentais similares foram anunciados – mostra bem que as reivindicações dos manifestantes não podem ser reduzidas a isso: é todo o Sistema político dos EUA – baseado num racismo sistémico e incarnado, de forma mais evidente, na Polícia – que eles põem em causa.
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Crónica publicada no semanário francês “Informations Ouvrières” – Informações operárias – nº 615, de 30 de Julho de 2020, do Partido Operário Independente de França.