A 18 de Fevereiro, o Rei convocou o Conselho de Ministros para o seu Palácio da Zarzuela, em virtude dos poderes que lhe são conferidos pela Constituição de 1978 como primeira autoridade estatal por via de sucessão – um facto extraordinário, a segunda vez desde o actual Rei ter sido entronizado… depois do seu pai se demitir, enleado em múltiplos escândalos de corrupção.
O Governo, de acordo com o seu porta-voz, “informou” o Rei sobre a sua política e os seus planos (sem outros comentários). Para dizer as coisas de maneira clara, as instituições herdadas do regime de Franco não desistiram, pelo contrário, de colocar o Governo sob tutela, ou melhor, de lhe indicar linhas vermelhas.
A situação é preocupante, pois cada vez mais sectores de trabalhadores, grande número de jovens e de agricultores não estão dispostos a aceitar a política de contra-reformas sociais e democráticas, que se agravaram desde 2010 e do governo de Zapatero.
Na verdade, agora é praticamente em todo o Estado que os agricultores se manifestam para exigir preços justos contra a ditadura dos monopólios, dos grandes distribuidores e da indústria agro-exportadora. Uma situação agravada pela Política Agrária Comum (PAC) da UE outorgada à grande propriedade agrária. Não é a alegada manipulação da Direita que pode obscurecer os males básicos da campesinato, que sofre a arbitrariedade dos grandes proprietários agrários.
A crise que se avizinha no sector dos automóveis, com a ameaça de encerramento da Nissan, coloca mais uma vez sem trabalho uma parte de um dos sectores líderes da classe operária.
Mais de trezentas plataformas de aposentados, que estão a organizar a sua quarta assembleia nacional a 12, 13 e 14 de Março, preparam-se para acentuar a sua mobilização em defesa do actual Sistema público de pensões… ao mesmo tempo que sofrem uma ofensiva, sob várias formas, para as integrar no Pacto de Toledo (um pacto estabelecido em 1995, que elabora as recomendações de reforma do Sistema, a fim de que elas sejam aprovadas pelo Governo).
Um mês e meio depois da formação do Governo – cujo programa se auto-proclama “progressista” – este tem respondido através de promessas, de meias-medidas, de boas palavras e de paliativos.
Mas o governo de Sanchéz-Iglesias – que jurou respeitar a Constituição e ser leal ao Rei – aprendeu algo com o historial do governo de Rajoy. E concluiu não ser possível governar este país sem diálogo. Ou seja, sem envolver os sindicatos na sua governança e, para além disso, sem um acordo com os partidos que representam os povos catalão e basco.
Isto tem um custo: não há diálogo social sem algumas concessões, como por exemplo modificar a lei sobre o livre despedimento em caso de doença. O Governo promete modificar os aspectos mais nocivos das leis do trabalho, mas não as revoga. Procede da mesma maneira com a Lei “mordaça” (1) e com a LOMCE (2).
Isto responde às exigências das massas?
A 20 de Fevereiro, a ministra da Política de Gestão do Território, Carolina Darias, e o Conselheiro (ministro) da Administração Pública, Josu Eskoreka, decidiram – por comum acordo – transferir para a Autonomia (província) basca a gestão da Segurança Social.
“As pensões serão sempre pagas e garantidas pelo Governo de Espanha, mas a gestão dos Fundos, os meios materiais e os edifícios vão depender do Governo basco.” Trata-se de gerir 9,5 mil milhões de euros. É isso que exigem os pensionistas que já se vêm mobilizando há dois anos? O Governo basco será mais eficaz?
Tendo em conta o desastre que constitui a enorme montanha de lixo concentrado em Zaldivar (Biscaia, “gerida” pelo PNV basco, no qual ficaram soterrados dois trabalhadores a 6 de Fevereiro), é fácil de encontrar a resposta. Esta medida é mais um passo no sentido da ruptura da Caixa Única (da Segurança Social), ou seja, da destruição do sistema público.
Porque, não nos enganemos, os governos regionais sofrem dos mesmos males que o Governo central. Foi isto que nos recordaram os trabalhadores de Tarragona – com a sua greve de 100%, do dia 19 de Fevereiro, em defesa do respeito das medidas de segurança não aplicada pela empresa e tolerada, de facto, pelo Governo regional da Catalunha, no complexo petro-químico de Tarragona (o mais importante de Espanha).
Não há dúvida de que eles também estão à procura de paliativos – no diálogo aberto entre o governo de Sanchéz e o governo da Generalidade (da Catalunha) – através da concessão do “terceiro grau” (que permite alguma flexibilidade) para os prisioneiros republicanos. Muito longe da exigência de liberdade e do fim das acções judiciais contra mais de 2.500 cidadãos da Catalunha!
Os limites do Governo – fixados pela Coroa e pela alta finança – estão a chocar-se, cada vez mais, com o movimento de resistência que se iniciou e procura expressar-se em todo o Estado.
A satisfação das reivindicações de fundo coloca – a todo o movimento operário, aos povos, e às suas organizações – a questão de decidir sobre uma palavra de ordem simples, apresentada pelos pensionistas: qualquer que seja o Governo, as pensões (as reivindicações), nós defendêmo-las.
22 de Fevereiro de 2020
NOTAS
(1) Esta Lei Orgânica de Protecção da Segurança dos Cidadãos – que é conhecida como “lei Mordaça” – é drasticamente limitadora da liberdade de expressão.
(2) LOMCE é o acrónimo de “Ley Orgánica para la Mejora de la Calidad Educativa” (Lei Orgânica para a Melhoria da Qualidade da Educação).
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Análise de Angel Tubau, publicada no semanário Informations Ouvrières – Informações operárias – nº 593, de 26 de Fevereiro de 2020, do Partido Operário Independente, de França.