Numa acção sem precedentes, que representa um atropelo à democracia, a Junta Eleitoral Central (JEC) – a qual, como foi recordado pela porta-voz do PSOE, não é um órgão jurisdicional, mas sim um tribunal administrativo – por 7 votos a favor e 6 contra, acaba de incapacitar Quim Torra – o presidente da Generalitat (1) – e Oriol Junqueras, para impedir que este último não possa sequer assumir o seu lugar de eurodeputado. Tudo isto para satisfazer o recurso apresentado pelo PP, o Ciudadanos e o Vox – a Direita franquista aliada com as instâncias judiciais do Poder – que actuaram como aríete.
A decisão de incapacitar Torra e Junqueras não é apenas uma barbaridade jurídica. É também a enésima constatação da sobrevivência do Franquismo em todos os âmbitos do aparelho de Estado, e da sua utilização para dinamitar qualquer possibilidade de saída política para a questão catalã.
Qualquer trabalhador ou jovem sabe isto. Aqueles que estão atrás da decisão da JEC, não querem diálogo, nem que se constitua um Governo que adopte medidas a favor da maioria social. Não querem que seja revogada a reforma laboral (ainda que seja parcialmente), nem que seja eliminado o factor de sustentabilidade (que permite a perda de poder aquisitivo das pensões), ou que seja revogado o Artigo 315.3 do Código Penal (que permite encarcerar sindicalistas por fazerem greve).
Não querem nada disso, ainda que seja uma mínima parte do que um Governo realmente “progressista” deveria implementar imediatamente, e ainda que não responda exactamente ao que esperam milhões de trabalhadores e jovens. Tem toda a razão Oriol Junqueras quando diz que os esgotos do Estado e o PP estão de mão dada.
Os factos demonstram, teimosamente, que – para que as liberdades mais elementares não sejam violadas, para que estas não estejam a ser permanentemente tuteladas pelas instituições herdadas do Franquismo – é necessária a República. República do Povo e para os Povos, que garanta os direitos sociais e democráticos, e a união livre e fraterna de todos eles.
E hoje, mais do que nunca, em vésperas da constituição de um novo Governo, é necessária a mobilização em defesa das reivindicações, contra a decisão da JEC.
Somos um jornal operário que se situa sempre em defesa das liberdades, pela liberdade dos presos e o direito a decidir, e por esta razão nos opomos – como a maioria dos trabalhadores – às políticas anti-sociais, aplicadas nos últimos anos tanto pelo Governo central como pelos diversos governos da Generalitat. Políticas que, no caso do governo da Generalitat, foram adoptadas em nome da bandeira da luta pela soberania nacional da Catalunha, quando na realidade aquilo que implicam e aonde conduzem é exactamente o contrário. Afirmamos que a luta pela soberania do povo catalão – e de todos os povos – é incompatível com a política de cortes sociais que afundam a saúde, o ensino e os serviços públicos básicos.
Não pode haver direitos nacionais sem direitos sociais, e vice-versa. Mas, com a mesma veemência, afirmamos que não pode deixar-se passar semelhante atropelo à democracia. Para qualquer cidadão que se reclame da democracia, para as organizações que falam em nome dos trabalhadores, é uma obrigação tomarem posição neste sentido.
Madrid, 4 de Janeiro de 2020
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(1) A Generalitat (Generalidade da Catalunha) é o sistema institucional em que se organiza politicamente o autogoverno da Catalunha. Tem as suas raízes nas Deputações Permanentes, no século XIV, sob a administração da Coroa de Aragão. A sua sede é o Palácio da Generalidade, na cidade de Barcelona.
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Este documento é a tradução da Declaração do Comité de Redacção do jornal Información Obrera (Informação Operária) – Tribuna livre da luta de classes em Espanha – de 4 de Janeiro de 2020.