Mais uma vez, a Síria está em chamas com a sua procissão de mortos, de deslocalizados e de terror (1). O Governo turco decidiu atacar as milícias curdas da Síria – que ele denuncia como terroristas – visando, diz ele, impedir a unidade entre os Curdos da Síria e os da Turquia. Com este fim, reuniu milhares e milhares de combatentes árabes sírios, que são refugiados na Turquia – os quais eram essencialmente antigos jihadistas – baptizando estes mercenários como “Exército sírio livre”.
As milícias curdas têm sido supervisionadas e trabalhavam em conjunto com o Exército dos EUA, o qual reconhece ter sido graças a essas milícias que o Daech foi esmagado. Durante semanas, o Presidente da Turquia (Erdogan) anunciou uma grande operação contra os Curdos da Síria e pediu a Trump a retirada das tropas norte-americanas desta região.
A decisão do Trump de retirar as suas tropas foi um apoio implícito à operação turca. Desde então, Trump tem ameaçado a Turquia com sanções se a operação militar continuar, operação que ele promoveu. A Rússia, por um lado, condenou a intervenção da Turquia e, por outro, impediu o Conselho de Segurança da ONU de condenar essa intervenção. Pela sua parte, Macron e os diversos governos dos países da União Europeia denunciam a intervenção turca. É o grande baile dos cínicos.
Desde há oito anos, a Síria tem sido devastada pela guerra, que já provocou centenas de milhares de mortes, pessoas que tiveram de fugir da guerra e da Síria – toda a gente sabe que os que chegam à Europa são perseguidos pelas forças policiais da União Europeia. Em 2011, desenvolveram-se na Síria mobilizações populares, em ligação com as revoluções na Tunísia e no Egipto. Imediatamente, a Arábia Saudita, os EUA, a França e outros governos de países europeus intervieram, financiando, armando e supervisionando milícias a que irão chamar “Exército sírio livre”. Eles governos são completamente responsáveis pela situação na Síria. Em seguida, este “Exército sírio livre” dará origem aos grupos Al Qaeda e Daech, instituindo um alegado “Estado Islâmico” numa parte da Síria. Perante a crise, à escala global – e, nomeadamente, do imperialismo norte-americano – a Rússia e o Irão intervieram militarmente para apoiar o Regime sírio (comandado por Bashar-el-Assad). Nesta situação de crise da liderança mundial, potências regionais – como a Turquia, o Irão e a Arábia Saudita – mas também a Rússia, irão jogar o seu próprio jogo para defender os seus interesses.
As grandes potências, nomeadamente os EUA e a França, assumem inteira responsabilidade por esta devastação da Síria, assim como pelas manobras perigosas que fizeram e continuam a fazer, tornando a situação fora de controlo. É de notar que existem vários milhares de soldados dos EUA na Síria, mas também várias centenas de soldados das forças especiais francesas.
As lágrimas de crocodilo actuais sobre a questão dos Curdos não podem esconder a esmagadora responsabilidade das grandes potências em relação ao massacre do povo sírio no seu conjunto.
———————————————–
(1) Pelo menos 160 mil pessoas já foram deslocadas, das quais 70 mil crianças, segundo a ONU.
———————————————
Crónica de Marguerite Leuwen, publicada no semanário Informations Ouvrières – Informações operárias – nº 575, de 16 de Outubro de 2019, do Partido Operário Independente, de França.