ARGÉLIA: A oito dias da “rentrée”, a revolta social cresce

Estudantes_argelia

A uma semana da “rentrée”, um vento de cólera varre o país. Em Lakhdaria, em Sétif, em Médéa, por causa dos cortes de água, os protestos e o bloqueio de estradas multiplicam-se. Um grande número de conflitos tem lugar em muitas localidades sobre a questão da habitação, do fornecimento de água, do desemprego e outras. A principal artéria da cidade de Biskra foi bloqueada pelos habitantes para reclamar empregos. Na região de Guelma, em muitas comunas, os habitantes bloquearam as estradas para exigir trabalho e alojamentos. Poderíamos multiplicar os exemplos através de todo o país. (1)

CÓLERA SOCIAL

 «A crise social existe de facto, e os cidadãos fazem-no saber quase todos os dias, manifestando-se por todo o lado e a todo o momento, em várias localidades de diversas regiões do país, face a diversas penúrias e privação de comodidades de todo o tipo, em serviços vitais e, por vezes mesmo, em bens de consumo supostamente essenciais. Problemas de água, de electricidade, de gás, de escola, de saúde, de trabalho,… O mal-estar social, a degradação do nível de vida, o desemprego, a erosão do poder de compra e o regresso de fenómenos de pauperização dos sectores menos favorecidos e de precarização da chamada classe média fazem nascer assim a outra razão do descontentamento popular contra o Regime» (Liberté, 27 de Agosto).

«Todos os indicadores estão no vermelho. O poder, que fez refém o país, transformando-se num obstáculo a qualquer solução negociada para sair da crise política, está a complicar perigosamente a situação económica» (El Watan, 26 de Agosto).

Esta situação põe em pânico os partidários do Regime. É nestas condições que Gaïd Salah, o Chefe de Estado-maior do Exército, tenta preservar o Regime acelerar as tomadas de decisão. Num novo discurso, a 26 de Agosto, ele apelou ao acelerar da preparação da eleição presidencial, de forma a que ela aconteça nas semanas que vêm. Ele apelou ao Painel (2) para ir mais rápido na organização dessa eleição. Ele criticou uma vez mais os partidários da «transição».

Na mesma ordem de ideias, ele rejeitou também a «agenda pré-estabelecida» que alguns querem «impôr» ao futuro Presidente. Sendo o objectivo dessa démarche, acrescenta ele, «evitar todas as fases de transição cujas consequências são perigosas, preconizadas por certos partidos que não têm outro objectivo senão a satisfação dos seus interesses limitados e os dos seus mandatários». Partidos, lançou ele sem os nomear, «que começam a ser desmascarados, e nós temos informações confirmadas da sua implicação, que nós desvendaremos no momento oportuno» (El Watan, 27 de Agosto).

PARA O REGIME, TRANSIÇÃO E PROCESSO CONSTITUINTE, É NÃO!

O Chefe de Estado-maior ameaça directamente aqueles que recusam a eleição presidencial e que apelam a uma transição no quadro de um processo constituinte, ou seja, o Pacto para a Alternativa Democrática. Ele acusa-os de estar às ordens do imperialismo francês e ameaça-os com perseguições judiciais. Esta nova escalada no tom da ameaça traduz o pânico do Regime. Aliás, é o próprio Chefe de Estado-maior a reconhecê-lo quando, no seu discurso, declara: «A lógica impõe que a preparação destas eleições comece nas semanas vindouras, porque o tempo não está do nosso lado» (El Watan, 27 de Agosto).

Com efeito, a manifestação de Sexta-feira, 23 de Agosto, foi mais numerosa do que a da semana passada – os argelinos desceram às ruas em massa. Eles gritaram, como é seu hábito, palavras de ordem exigindo a saída do Regime, a libertação dos presos políticos, um Estado civil e não militar, mas sobretudo as palavras de ordem foram concentradas contra Gaïd Salah. Este aparece, aos olhos do povo argelino, como a último reduto para a manutenção do Regime, e os argelinos querem que este Regime desapareça. Esta crise do Regime refracta-se na incapacidade do Painel em implementar esse famoso «diálogo», que a maior parte dos partidos rejeita. É nestas condições que as manobras se multiplicam. O líder do partido Jil Jadid propõe uma eleição presidencial acoplada a um processo constituinte, tentando assim unificar as posições das Forças da Mudança, dirigidas pelo ex-ministro Benflis, partidário da eleição presidencial, e as do Pacto para a Alternativa Democrática, que recusa essa eleição e se pronuncia por um processo constituinte.

PRESIDENCIAL OU CONSTITUINTE

No Sábado, 24 de Agosto, o Fórum da sociedade civil realizou uma Conferência para a qual foram convidadas todas as forças políticas, nomeadamente as Forças da Mudança (de Benflis) e o Pacto para a Alternativa Democrática. Uma delegação representativa deste último participou nela para exprimir o seu ponto de vista, precisando que eles estavam lá a título de observadores.

«A missão afigura-se árdua dadas as divergências de ordem política e ideológica e, em consequência, também aos roteiros propostos, mesmo se os seus promotores estão confiantes quanto ao seu resultado. De onde o lançamento da ideia de uma “terceira via” que parece desenhar-se, que é um compromisso entre as duas forças políticas. Uma eleição presidencial geminada com um processo constituinte centrado em torno de emendas constitucionais, para nomeadamente reduzir os poderes presidenciais, ou então de uma Declaração constitucional, que obrigaria o Presidente eleito a realizar os compromissos feitos referentes às mudanças desejadas pela população. É preciso recordar que, até agora, duas tendências fortes emergiram. A dos partidários da convocação directa de uma eleição presidencial, apesar das condições que garantam a sua transparência não estarem reunidas, e a dos que advogam um processo constituinte.

Os primeiros estão agrupados em torno da Frente da Mudança, que organizou, a 5 de Julho, o Fórum do diálogo nacional, e os segundos fazem parte da Alternativa Democrática. Até agora, uns e outros agarram-se à sua visão das coisas. Para os partidários de uma eleição presidencial (MSP, FJD, Talaie El Hourriyet,…), o processo constituinte geraria riscos na medida em que, tendo em conta as contradições doutrinárias que existem na sociedade, os debates no seio de uma Assembleia Constituinte poderiam eternizar-se. Em contrapartida, para as formações políticas da Alternativa Democrática (RCD, FFS, MDS, PLD, PT,…), ir directamente para uma eleição presidencial com a Constituição actual não faria senão manter o Sistema» (El Watan, 26 de Agosto).

No fim do primeiro ponto da ordem de trabalhos, a delegação do Pacto para a Alternativa Democrática retirou-se da Conferência, tendo em conta que o segundo ponto era a constituição de comissões para avançar na via do projecto das Forças da Mudança. Os representantes do Pacto para a Alternativa Democrática explicaram que não eram adeptos desse processo e que iriam realizar uma outra Conferência, a 31 de Agosto, sob a base da sua própria plataforma.

Segundo as últimas notícias, não é seguro que esta Conferência se possa realizar, por falta de autorização oficial para uma sala. A denúncia pelo Regime e os seus agentes do processo constituinte exprime o terror dos seus defensores perante a possibilidade das massas argelinas definirem elas mesmas o seu futuro, através de um livre debate que desemboque numa Assembleia Nacional constituinte e soberana.

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NOTAS

(1) Crónica publicada no semanário Informations Ouvrières – Informações operárias – nº 568, de 28 de Agosto de 2019, do Partido Operário Independente, de França.

(2) Trata-se do chamado Painel Independente de Diálogo Nacional e Mediação na Argélia, nomeado pelos militares que detêm o poder efectivo nesse país.

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Proibição!

A wilaya (distrito) de Argel proibiu a Conferência que o Pacto para a Alternativa Democrática iria organizar, a 31 de Agosto.

Louisa Hanoune continua na prisão

Os advogados de Louisa Hanoune apresentaram um novo pedido para a sua libertação provisória. Eles esperam que o Tribunal Militar se pronuncie. Mas na Comunicação social apareceu a informação seguinte – segundo fontes «bem informadas», como elas próprias dizem: o processo e a instrução respeitantes a Louisa Hanoune durarão ainda meses e meses.

 

 

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