“O povo palestiniano tem direito a existir”

PalestLand

Divulgamos uma entrevista com Nedal Rafeh, militante da “Campanha por um só Estado democrático”, publicada no semanário Informations Ouvrières – Informações operárias – nº 568, de 28 de Agosto de 2019, do Partido Operário Independente, de França.

P – A situação na Palestina foi marcada, este Verão, por uma aceleração da demolição de casas palestinianas e de novas ameaças aos refugiados, particularmente no Líbano. Podes dar-nos a tua apreciação sobre estes desenvolvimentos?  

R – As demolições são porque Israel confisca cada vez mais terras. Elas agravam uma situação que é já de uma extrema gravidade. Eles queriam continuar com as expulsões, continuar com a Nakba, mas perante isso, os Palestinianos continuam a resistir e pedem, muito simplesmente, o direito a viver em sua casa, o direito a existir. As demolições têm lugar em Jerusalém, mas também nos territórios de 1948 (o Estado de Israel, NdT); o Governo israelita não faz qualquer distinção e, para nós, é essencial trabalhar para a unidade dos Palestinianos, porque fora de um agrupamento deste tipo não teremos jamais a relação de forças para fazer respeitar os nossos direitos.

É preciso compreender bem que vai fazer setenta e dois anos que nos tornámos estrangeiros em nossa casa, sem-direitos, refugiados cujos campos estão por vezes a alguns quilómetros apenas das cidades e aldeias das quais os pais ou eles próprios foram expulsos. Faz muito tempo que Israel age para apagar o estatuto de refugiado; mas, quer ele queira quer não, os refugiados continuam presentes, à espera. Em Gaza, eles decidiram organizar uma marcha pacífica pelo retorno e, desde há ano e meio, eles mantêm a sua mobilização, apesar dos snipers israelitas. Agora, Trump decidiu passar a uma etapa superior, asfixiando financeiramente os Serviços que ajudam os refugiados.

P – Isso faz parte daquilo a que Trump e o seu genro encarregue do dossier, Jared Kushner, chamam o «Acordo do século», cuja componente principal continua a não ser revelada…

R – O que procura o Governo norte-americano, o que procuram Kushner e Trump? O seu projecto volta a negar, ainda mais brutalmente do que antes, o direito à autodeterminação dos Palestinianos, o direito a existir, pura e simplesmente. Reforçar as medidas securitárias, forçar os Palestinianos a renunciar ao estatuto do refugiado, empurrá-los a partir em troca de um pouco de dinheiro, ou então – e isto não é melhor –, não lhes oferecer senão a perspectiva de trabalhar em zonas económicas especiais, tudo isto não fará senão agravar a situação. Kushner procura estabelecer um Plano para acabar com o estatuto de refugiado, que se tornou numa identidade essencial do povo palestiniano, que é um povo de refugiados, de famílias fragmentadas, e que quer voltar para sua casa. Eles querem suprimir o direito ao retorno, que é reconhecido pelo Direito internacional e é considerado por Israel como uma ameaça permanente. É como se eles quisessem matar as últimas esperanças de paz, de liberdade. Eles troçam dos direitos palestinianos. O seu discurso é desonesto. Eles falam sem parar de justiça, mas fazem exactamente o contrário.

P – Recentemente, a Comunicação social israelita publicou a tradução de um «Relatório secreto» apresentado pelos comandantes dos serviços de segurança na Cisjordânia, sob a direcção da Autoridade Palestiniana. Este Relatório é um sinal de alarme. Ele evoca a degradação das condições de segurança para fazer face ao estado de espírito dos jovens entre os 16 e os 25 anos, que não têm nenhuma perspectiva de futuro e que «poderão levar a cabo acções violentas». O Relatório explica que os jovens já não têm esperança no «processo de paz» e considera que «as eleições na Knesset não desembocarão senão em dirigentes israelitas extremistas». O que podes dizer sobre o estado de espírito da juventude palestiniana?

E – Imaginem que viviam em vossa casa como se estivessem numa prisão, sem poder ir ao mar, à praia, que é a vinte quilómetros, sem poder deslocar-se livremente. Os jovens na Cisjordânia, que não conheceram senão a Autoridade Palestiniana, só viram degradar-se as suas condições de existência. Eles têm todos parentes na prisão. A maior parte já foi humilhada pelas forças de ocupação. Têm vontade de viver, mas os jovens apenas sobrevivem, num país sem nenhum futuro.

Em todos os aspectos da vida quotidiana, eles estão limitados nos seus projectos, controlados muitas vezes várias vezes por dia, o Exército de ocupação e os colonos civis disparam a matar, há mortos, prisões todos os dias, friso bem todos os dias, é este o quotidiano dos jovens palestinianos na Cisjordânia. A polícia da Autoridade Palestiniana é igualmente muito violenta quando os jovens se agrupam, procurando protestar. Eles têm todos o sentimento de estar numa prisão, enquanto não pedem senão para poder viver. As pessoas querem ser independentes, viver a sua vida sem ameaças quotidianas. Este sentimento é largamente partilhado pelos jovens do Fatah (Partido de que é membro Mahmoud Abbas, Presidente da Autoridade Palestiniana, NDT) e é conhecido que já não têm nenhuma confiança nos dirigentes desse Partido. Acontece com os jovens de toda a Palestina, que não têm senão uma alternativa: resistir ou apenas sobreviver.

No contexto actual, não há alternativa à Direcção palestiniana oficial. Esta Direcção colapsou, ela é rejeitada pela juventude e não só. Também já não existe confiança na Direcção norte-americana, que faz unicamente aquilo que Netanyahou pede.

Os Palestinianos vivem com Israel, reconheceram mesmo Israel, mas todas as suas esperanças foram goradas; então, agora é tempo de Israel reconhecer os Palestinianos. Os nossos direitos à liberdade e à justiça não são negociáveis. Pela primeira vez, aquando das últimas eleições legislativas, a taxa de abstenção dos Palestinianos do interior foi de 50%. No entanto, muitos são aqueles que pensam que o facto de ter alguns deputados árabes na Knesset é necessário para os representar. É um debate sério e não devemos deixar que isso nos divida.

P – Tu participas na «Campanha por um só Estado democrático». O que é que te determinou a juntares-te a esta iniciativa e a militares nela?

R – A ocupação não é positiva também para os Israelitas, mas eles têm uma boa economia, eles vivem bem, eles viajam e são totalmente indiferentes à sorte dos Palestinianos. Eles aceitam o que se passa em Gaza mas, na sua grande maioria, são totalmente indiferentes; eles deviam deixar de ser egoístas, porque somos obrigados a viver juntos. O apartheid é intolerável. Todos os povos do mundo querem ter os mesmos direitos no seu país. Nós não pedimos nada mais do que isso. Nas sondagens, há sempre uma maioria de Palestinianos que aspiram a ter um Estado palestiniano, mas há cada vez menos convicção e esperança de o conseguir. Se verdadeiramente o mundo quisesse um Estado palestiniano, esse Estado existiria desde há muito tempo.

Aquilo que as pessoas querem, sobretudo, é direitos iguais e liberdade; e, a esse nível, é minha convicção que isso passa por abolir as fronteiras no território da Palestina. É por isso que eu milito presentemente na Campanha por um só Estado democrático.

A Campanha começou nos territórios de 1948, mas ela começa a alargar-se a todos os territórios da Palestina histórica. Há militantes judeus que são seus membros. Direitos iguais e liberdade: não há outra saída.

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