Crise política em Portugal: o Governo ameaça demitir-se

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Carmelinda Pereira (dirigente do POUS) e José Casimiro (membro da Coordenadora Nacional de Trabalho do Bloco de Esquerda) estiveram a representar Portugal numa reunião (1), realizada a 4 de Maio, onde foi constituído um Comité de correspondência europeu.

Transcrevemos uma entrevista que eles deram ao semanário do Partido Operário Independente (POI) francês, Informations Ouvrières (Informações operárias), nº 552, de 8 de Maio de 2019, que fez uma cobertura completa dessa reunião.

 José, na intervenção que fizeste na reunião evocaste os desenvolvimentos da crise política em Portugal. Podes resumir?

José Casimiro (J. C.): Sim, o governo do PS está confrontado com a aprovação, pela Comissão de “Educação” da Assembleia da República, de um Decreto defendido pelo BE, o PCP, o PSD e o CDS. Os professores exigem a contagem integral dos nove anos, quatro meses e dois dias de serviço congelados. Foi-lhes proposto um simulacro de negociações.

O Decreto prevê, para este ano, a recuperação de dois anos, nove meses e dezoito dias, e, em seguida, negociações com os sindicatos para estabelecer o calendário da recuperação integral. Pela sua parte, o BE desejava que esse calendário não ultrapassasse 2023, o que foi rejeitado pela Direita.

E como reagiu o Governo?

J. C.: O PS não pode aceitar isso, invocando a sustentabilidade das Finanças públicas e o respeito pelos objectivos de redução da Despesa pública. Mas existe dinheiro! Responder às reivindicações dos professores significa 360 milhões de euros, o que sobe para 800 milhões se esta recuperação for aplicada a toda a Administração pública.

Em contrapartida, o Estado foi recentemente autorizado, pela União Europeia, a financiar as dívidas dos bancos privados (o que equivale a 3,2 mil milhões de euros). E quem os irá pagar? Seguramente que somos nós! É assim que o Novo Banco, que foi privatizado depois do Estado português ter feito nele um investimento enorme – com o nosso dinheiro, claro – recebe várias centenas de milhões de euros. Por outro lado, as parcerias público-privadas (PPP) recebem do Estado um financiamento da ordem de 2 mil milhões de euros.

Em relação a este assunto, está em discussão neste momento uma nova Lei de Bases da Saúde, na qual o BE propôs em particular que fossem excluídas novas PPP neste sector. Parecia estar a ser conseguido um acordo, mas o PS voltou atrás nestes últimos dias.

Este Governo, considerado por muitos como “o bom aluno da Europa” reduziu o défice público para 0,5% do PIB, e pretende atingir o objectivo de 0%. Mas, a que preço? É verdade que houve aumentos do salário mínimo e das pensões de aposentação, mas os serviços públicos estão completamente subfinanciados.

Para este Governo há dinheiro para o capital, mas não para a população. Trata-se de uma fuga para a frente. E o que faz o Primeiro-ministro? A 3 de Maio, ameaçou demitir-se.

Carmelinda Pereira: A situação é explosiva. Como o José já disse, o governo do PS ameaça publicamente demitir-se se o Decreto for adoptado pelo Parlamento, na sessão plenária do próximo dia 15 de Maio (votação entretanto antecipada para 10 de Maio). Ele quer apresentar-se como vítima! Considera que os partidos que tiveram a iniciativa do Decreto estão a “brincar com o fogo”.

Mas é este Governo que faz uma política a favor dos bancos e do reembolso da dívida pública, contra os direitos dos trabalhadores. Ele ataca todas as conquistas sociais arrancadas pela luta das classes trabalhadoras e que foram inscritas na Constituição, após a Revolução portuguesa.

Aliás, nós estamos empenhados – em igualdade com outros militantes – na construção de um Movimento nacional de Defesa das Conquistas de Abril (1974), já tendo havido reuniões nesse sentido na Marinha Grande, em Lisboa e em Coimbra.

Actualmente, tudo pode provocar uma crise política crucial. Mário Nogueira, o Secretário-geral da FENPROF, declarou aos jornalistas que se o Governo se demitisse, “a única coisa que lhe podemos dizer é… boa viagem”.

Para este Governo, as reivindicações dos trabalhadores e os serviços públicos são incompatíveis com o Pacto orçamental europeu.

Os professores têm razão, tal como a têm os motoristas dos camiões-cisterna que fizeram greve recentemente, ou os enfermeiros e os assalariados da Petrogal que lutam para preservar os seus direitos colectivos.

Os trabalhadores exigem um Governo que restabeleça as suas conquistas, que acabe com a caducidade dos contratos colectivos, etc. A questão central é a da luta de classes.

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(1) Onde estiveram representados mais 15 países (Alemanha, Bélgica, Dinamarca, Espanha, França, Grécia, Holanda, Hungria, Itália, Polónia, Reino Unido, Roménia, Sérvia, Turquia e Ucrânia).

 

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